Por Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
Em dezembro passado o governo federal refez as contas dos gastos com a previdência e concluiu que gastará quase R$ 4 bilhões a menos, considerando impactos da reforma, inflação menor e as ações de pente-fino, que foram estabelecidas por lei em junho de 2019. Esta lei, aliás, estabelece até bônus de produtividade para servidores que identificarem irregularidades em processos de benefícios.
A parte do pente-fino foi razoavelmente bem-sucedida – espera-se até o final do ano uma redução acumulada de R$ 5 bilhões só em benefícios que necessitam avaliação médica para serem mantidos. Mas, a redução da fila de pedidos não teve o mesmo sucesso. Hoje, cerca de 2,0 milhões de pedidos pendentes de análise abarrotam as prateleiras do INSS. A nova força-tarefa proposta pelo governo Bolsonaro envolve a contratação de militares da reserva para auxiliar nas análises.
A força-tarefa, na realidade, não passa de um remendo de um governo que ignora a importância do atendimento aos mais pobres. A reforma da previdência foi aprovada e junto com ela avançou o sucateamento das estruturas do INSS, que limita cada vez mais o atendimento ao cidadão.
A mesma lógica se percebe na assistência social em geral. A agenda social do governo federal é altamente errática, minando inclusive o Bolsa Família, que também tem fila de espera de 700 mil famílias e está constantemente sob risco de ficar sem recursos. O pagamento do 13º só ocorreu, vale lembrar, graças à recursos oriundos da demora nas concessões de benefícios do INSS e também do pente-fino.
O próprio Ministro da Cidadania, Osmar Terra, empresta pouca atenção ao Bolsa Família. Para se ter uma ideia, fiz uma análise das postagens do ministro na sua conta no Twitter em 2019: ele usou nove vezes mais a palavra "maconha" do que "bolsa família" nas suas postagens; as expressões "pobre" ou "pobreza" aparecem em pouco mais de 1% dos tweets do ministro. Pode parecer bobagem, mas dá uma ideia de onde a energia se concentra.
A agenda social do governo federal está em pé de guerra com a agenda fiscal. E preocupa muito o desleixo generalizado com os mais pobres. Com o "time fiscal" sempre no leme, a conta tem caído invariavelmente no colo dos mais pobres, que são os que têm a menor representatividade política. É preciso ter consciência que é em tempos de crise que a proteção social se faz mais necessária. Ela jamais poderia ser moeda de troca em ajuste fiscal.