A afirmação do presidente do STF, Dias Toffoli, de que a implantação do chamado juiz de garantias é constitucional oferece uma firme indicação de que, mesmo retardada por seis meses, será mesmo efetivada a criação dessa nova figura do mundo jurídico brasileiro embutida na Lei Anticrime. Na prática, o juiz de garantias é uma vara especializada que controla a legalidade do processo, autorizando pedidos de prisão e soltura, escutas e quebras de sigilo, por exemplo. Se a eventual denúncia pelo Ministério Público for recebida pela Justiça, caberá a outro juiz o julgamento do processo.
Apesar da saudável polêmica e da oposição de parte considerável dos magistrados, a criação do juiz de garantias é um passo relevante no aprimoramento da Justiça
Apesar da saudável polêmica e da oposição de parte considerável dos magistrados, a criação do juiz de garantias é um passo relevante no aprimoramento da Justiça no seu sentido amplo – ou seja, a eficaz, imparcial e independente aplicação da lei, sem a ingerência de fatores, como o envolvimento do juiz no caso desde seu início, que possam eventualmente macular a qualidade e neutralidade de uma sentença.
A previsível proximidade de juízes e promotores pode conferir mais agilidade, mas nem sempre é salutar para o bom andamento dos processos – as distorções mais conhecidas foram evidenciadas pelos vazamentos dos diálogos da força-tarefa da Lava-Jato. Ali, ainda que as conversas não contenham qualquer razão que justifique alterações nas sentenças, há contatos embaraçosos entre o juiz Sergio Moro e procuradores, como a cobrança por novas operações e indicações para a obtenção de provas. Por mais que o juiz Moro tenha sido justo na aplicação da lei, seu engajamento do início ao fim dos processos em primeira instância acabou por deixá-lo vulnerável a tal proximidade, a ponto de, ainda que pontualmente, ter se confundido com a figura do investigador.
A lei aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro conferia um prazo de 30 dias para a implantação do juiz de garantias, um tempo claramente exíguo para uma mudança de tamanha envergadura. Fez bem o ministro Dias Toffoli, portanto, ao ampliar para seis meses esse prazo, além de ter deixado de lado na implementação da lei os crimes contra a vida, de violência doméstica e eleitorais, que seguem ritmos próprios. Essa definição, porém, ainda é provisória e dependerá de exame definitivo pelo plenário do Supremo.
Uma série de dúvidas perdura e deverá ser esclarecida neste meio ano para implantação, entre elas como se dará a efetivação do juiz de garantias em comarcas com apenas um juiz – uma hipótese em discussão é a criação da figura em âmbito regional. Ao anunciar o adiamento, o presidente do STF também já demarcou que discorda do aumento de despesas para implantar o juízo de garantias. “Trata-se de questão que passa muito mais por gestão judiciária e menos por criação ou provimento de vagas”, afirmou Toffoli, que também preside o Conselho Nacional de Justiça. A bem-vinda novidade do juiz de garantias exigirá mais eficiência dos tribunais, mas no fim sairão reforçados o Estado de direito e a boa prestação da Justiça a todos os cidadãos.