Por Jose Cesar Martins, sociólogo, fundador da Paradoxa Ventures
"... eu é que não me sento no trono de um apartamento
Com a boca escancarada, cheia de dentes
Esperando a morte chegar"
Raul Seixas
Não é preciso ser especialista para observar que no Brasil dos juros baixos há uma virada para negócios ligados às tecnologias digitais. Setores incumbentes rapidamente se digitalizam e adotam o jargão da inovação.
O caminho, porém, não é asfaltado por segurança e certezas. Até o nome do dinheiro que se aplica nesses negócios diz o que é: "capital de risco".
Montada sobre o pensamento mágico, a febre das startups surfa uma aura benévola. Se é startup, então é boa. Perigosa inocência. Disponibilidade de dinheiro não indica mais sucesso nos novos negócios. Indica apenas que a commodity "dinheiro" está mais disponível. Já o canal da originação de oportunidades advindas da economia do conhecimento, esse continua tão estreito quanto pode ser em uma economia dependente de commodities e com baixo padrão educacional.
Ora, se vivemos uma evasão de talentos como nunca vista e nossas instituições de pesquisa estão em colapso, de onde podem surgir os futuros unicórnios?
No mundo dos investidores profissionais, mais que achar o unicórnio, o esforço é para não ser ludibriado pelo "ouro dos tolos". Para ganhar a confiança de um investidor sério, não basta espuma autocongratulatória. Ao invés da complacência, espera-se rigor na aplicação de mecanismos de "seleção natural". Como no judô de alto desempenho, quando atletas treinam com colegas de categorias mais pesadas para estarem preparados na hora da verdade, nossas startups devem ser desafiadas para estarem aptas a desafiar.
Não ajudam eventos festivos, bordões pseudo disruptivos, e depois o silêncio quando entre as startups criadas surge um monstrengo com cara de esquema ponzi que vai roubar o dinheiro e as esperanças de investidores de boa fé.
É responsabilidade de quem lidera iniciativas pró inovação valorizar a crítica, não o elogio fácil. Compete a quem vende o sonho alertar para os riscos. Complacência no filtro de qualidade das oportunidades leva a uma representação raquítica e em nada ajuda a inovação.
A poesia do Raul Seixas segue atualíssima. O ouro de tolo, antes analógico e agora digital, continua a ser mais uma barreira a ser removida pelos verdadeiros inovadores.