Por André Perfeito, economista-chefe da Necton Investimentos
O governo tem uma agenda econômica muito clara, na qual Paulo Guedes afiançou que Bolsonaro irá andar na linha dos bons modos da ortodoxia econômica e do liberalismo de maneira geral. A ortodoxia econômica, diferentemente da heterodoxia, é uma escola de pensamento que privilegia a curva de oferta da economia e, neste sentido, busca dar incentivos para que esta se desloque e assim leve o PIB para frente.
De maneira geral, Guedes irá agir menos no alarde da macroeconomia e muito mais no silêncio da microeconomia. O diabo mora no detalhe, dizem, e o que se está buscando é agir nesse nível de detalhe para tentar destravar a economia como um todo. Por isso mesmo, não aparece tanto o que ele e sua equipe fazem; a microeconomia é um terreno silencioso. No entanto, dado o nível de ociosidade da economia, pouco adiantam esses incentivos. Se você é um empresário e tem máquinas paradas não é porque os juros estão mais baratos ou porque diminuiu a burocracia que irá comprar máquinas novas. Os juros podem ser negativos e você nem iria se dar ao trabalho de ir ao banco. A questão de curto prazo é a demanda.
Pois bem, temos que incentivar a demanda, mas sabemos que Guedes e equipe não irão colocar a mão no bolso. A ordem é segurar todos os gastos do governo. A estratégia neste sentido é liberar recursos que antes estavam represados e fazer que cheguem diretamente aos consumidores. Assim a liberação do FGTS cumpre os preceitos ortodoxos de uma locação mais liberal. Afinal, cada um sabe o que é melhor para si.
Contudo, há limites. Vamos fazer aqui uma conta de padaria. A liberação do FGTS, segundo o governo, será de aproximadamente R$ 45 bilhões e o PIB de 2018 foi de R$ 6,8 trilhões. Disso tiramos que a medida irá jogar na economia 0,6% a mais. Sabemos que nem tudo será usado para comprar. Afinal, com o endividamento elevado e contas atrasadas, boa parte vai parar fora da carteira antes de se poder usar. Vamos supor que metade seja usada para o consumo. Logo, o impacto provável da medida é de apenas 0,3%. Ou seja, se você projetava um PIB de 0,5% (como é meu caso) para 2019 você terá que revisar para 0,8%.
Sabemos também que nem tudo será sacado já e a maioria será só no quarto trimestre. Então, o efeito será apenas em 2020. A liberação do FGTS não é de fato uma medida para animar a demanda, mas antes uma medida que busca dar um uso melhor para um recurso que estava parado. Vamos continuar presos entre o presente e o futuro em busca da demanda perdida.