Mais do que se opor à essência da iniciativa, o Senado deu um recado claro a Jair Bolsonaro, no início da semana, ao derrubar o decreto presidencial que flexibilizava o porte de armas no país: o Congresso não aceitará, de forma passiva, a edição de medidas unilaterais, sem a discussão com o parlamento, que tratem de temas polêmicos e sensíveis, como esse, que divide os brasileiros. Se a opção do Planalto fosse por enviar um projeto de lei, o Legislativo – no qual todas as forças da sociedade estão representadas – e o governo teriam a oportunidade de um amplo, maduro e fundamentado debate sobre a questão das armas no Brasil. O controverso texto do Executivo agora será analisado na Câmara, mas entre os deputados também há resistência ao conteúdo. É possível, porém, uma discussão mais profunda caso avance a ideia de uma nova proposta, construída em consenso com o Congresso.
O desejável seria o desarmamento dos bandidos e o endurecimento com os mercadores da morte
Sabe-se que a posse e o porte de um armamento, por si, estão longe de assegurar menos violência. E que reagir a assaltos, mesmo quando a vítima é uma pessoa treinada, tem alto grau de letalidade. Mas também é fato que a exposição dos brasileiros à criminalidade é inaceitável. Armados até os dentes, não raro bandidos chegam ao requinte de zombar da polícia e da Justiça, gabando-se em redes sociais, de forma provocadora, exibindo revólveres, pistolas e fuzis. É a convicção da impunidade.
Armamentos que antes pareciam restritos a guerras passaram a ser objeto de farto comércio no país. Disseminam-se pelo submundo, enquanto o cidadão honesto, indefeso, reza para não atravessar o caminho dos bandidos ou não se ver encurralado em um fogo cruzado. O cenário que parecia restrito a campos de batalha e zonas conflagradas tornou-se parte do cotidiano principalmente de grandes cidades brasileiras, onde um número incontável de armas circula sem controle.
A distorção capturada pelo governo Bolsonaro é que, se a bandidagem, de fato, tem acesso fácil, também deveria ser ampliada, para a população, a possibilidade de ter e portar uma arma. O fato é que, sem soluções duradouras e sustentáveis, a criminalidade não será vencida de forma consistente e permanente.
O desejável, por óbvio, seria o desarmamento maciço dos criminosos e o endurecimento com os mercadores da morte, que contrabandeiam e comercializam armas para o Brasil. Para isso, não seria necessário decreto ou projeto de lei. Bastaria dar foco, prioridade, energia e recursos para, à luz da atual legislação, o aparato oficial ser fortalecido e os bandidos voltarem a temer andarem armados.