Ao aprovar, em primeiro turno, o fim da exigência de plebiscito para a privatização de três estatais, por ampla e sólida maioria, a Assembleia Legislativa deu uma demonstração de maturidade e responsabilidade raras vezes vista na história recente do parlamento gaúcho. Desde sempre, a Assembleia tem sido a pedra angular dos projetos de modernização e recuperação do Estado. Se a maioria dos parlamentares não quiser, não há vontade política de governos – seja de que tendência for – capaz de levar adiante a urgente necessidade de reforma do aparelho estatal.
A opção de 40 deputados é também a comprovação da habilidade do governador e seus líderes em dialogar
Para deputados que dependem do voto, reconheça-se, sempre foi mais fácil se abraçar a causas populistas – entendidas como aquelas que enxergam nos cofres estatais um poço sem fundo e sem dono, permanentemente disposto a conceder benesses e privilégios, revestidos pelo manto do "direito" e da "defesa do patrimônio público". A mudança de atitude verificada entre a maioria parlamentar na terça-feira passou a refletir agora a saturação do eleitorado com a constante procissão de demandas das corporações, que comandam um estamento já protegido pela estabilidade e aposentadoria integral. Enquanto isso, milhões de desempregados e subempregados sonham apenas em levar alguns trocados no fim do mês para casa e já se cansaram do discurso dos que querem conservar tudo como está.
A reversão da obrigatoriedade de plebiscito para extinguir ou privatizar estatais corrige finalmente a insensatez de parlamentares constituintes que estabeleceram essa blindagem à modernização do Estado, mas sequer cogitaram de exigir plebiscito para a criação de estatais. Essa nova e salutar posição da expressiva maioria dos parlamentares merece aplausos e reconhecimento dos eleitores. Mesmo com atraso, a mudança de visão evidencia a prioridade do Parlamento à imensa maioria da população. São pessoas que não sobem em caminhão de som e nem têm tempo e capacidade de mobilização para lotar galerias ou fazer manifestações diante da Assembleia ou do Palácio, mas precisam urgentemente dos serviços públicos essenciais, como saúde, educação e segurança.
A opção de 40 deputados pela maioria silenciosa e pelo futuro é também a comprovação da habilidade do governador Eduardo Leite e seus líderes em dialogar e alinhar sua diversificada base parlamentar em torno de objetivos comuns. O desafio agora é manter o norte das mudanças, sem ceder à gritaria e sem cair nas armadilhas de reagir desmesuradamente ao previsível descontentamento das corporações. Se o espírito que moveu a maioria da Assembleia rumo à transformação do Estado se mantiver na mesma direção renovadora, volta a ser possível sonhar com um Rio Grande do Sul disposto a deixar para trás a estagnação, os atrasos nos vencimentos dos servidores e a virtual paralisia dos investimentos públicos.