São evidentes os sinais de disfunção na relação do Palácio do Planalto com o Congresso. Os problemas são decorrentes da noção de que eleição é carta branca e da falsa sensação de onipotência proporcionada pela rede de apoiadores nas mídias sociais. Por outro lado, boa parte do Congresso tem dado repetidas mostras de irresponsabilidade e votado apenas matérias que possam, à custa dos impostos dos contribuintes, gerar efeitos populistas nas bases.
O governo peca também ao se perder em controvérsias inúteis do ponto de vista da administração e da urgente geração de renda e combate ao desemprego, como as trapalhadas do Ministério da Educação (MEC) e o desperdício de tempo com a discussão sobre comemorar ou não um golpe militar dado há nada menos do que 55 anos.
No mundo real, nem regimes de força governam sem apoio de aliados
O resultado concreto é que, em três meses de governo Jair Bolsonaro, foram apresentados 16 projetos ou medidas provisórias pelo Executivo. Nenhuma das propostas foi adiante, conforme levantamento do jornal O Estado de S. Paulo. Entre as propostas apresentadas até agora, a mais relevante é que altera as regras da Previdência e, mesmo assim, só ganhou relator duas semanas depois de encaminhada. Até hoje, nem sequer foi votada a medida provisória que reduziu de 29 para 22 o número de ministérios.
Além de não conseguir votar temas de interesse do país, o governo já enfrentou duas derrotas expressivas. Uma delas é a que instituiu o orçamento impositivo, limitando a capacidade de ação do Executivo. Umas das razões seriam justamente os desentendimentos entre o presidente da República, Jair Bolsonaro, e o da Câmara, Rodrigo Maia.
No mundo real, nem regimes de força governam sem apoio de aliados. Por isso, é promissor que, em contraponto com o isolamento que o governo, por arrogância ou falta de astúcia política, se impôs nos primeiros 90 dias, a alta administração federal demonstre mais disposição para conversas e diálogo com o Congresso e outras forças políticas e sociais do país.
É altamente nociva a forma como governos anteriores obtiveram apoio parlamentar _ o famoso balcão de negócios, que gerou corrupção em escala industrial. É altamente positivo que o atual governo não incorra nos erros de seus antecessores. Ao retomar as conversas com partidos e lideranças políticas, o Planalto mostra que não precisa criar conflitos inúteis se quiser ter alguma chance de governabilidade.