Por Manoel Soares, jornalista
Os soldados, quando voltam da guerra, se sentem deslocados em um mundo que clama por paz. Eles aprenderam a ver o outro como inimigo e serem obrigados a entender que agora são somente pessoas é quase que contrariar a sua natureza.
É muito comum existirem em nações bélicas projetos que buscam reinserir esses combatentes em um mundo onde sua capacidade de tirar vida não é mais necessária. Nós precisamos importar essas iniciativas para o Brasil com urgência, pois, por mais que não estejamos em guerra com outras nações, acabamos de sair de um campo de batalha político digital.
Pessoas tinham como meta diária eliminar a outra no mundo virtual, seja subjugando suas opiniões ou convertendo-as para seu "lado". Uma guerra que dividiu colegas de trabalho, família, casais, gerando inclusive conflitos internos. A questão é que a guerra acabou, um lado ganhou e outros se declaram vigilantes, mas o campo de batalha não está mais tomado por soldados armados com textos, fotos e gifs. Porém a depressão pós-guerra está batendo e muitos tentam encontrar micro combates para travar porque a paz não mais alimenta.
Assim como nas guerras físicas alguns soldados canalizam sua frustrações e fragilidades psíquicas para o campo de batalha e desperta em seus corações o prazer de matar. Nas redes sociais não é diferente, humilhar, constranger e tripudiar o outro deixa de ser uma estratégia e passa a ser um traço de personalidade.
O conflito político não despertou os sociopatas digitais, ele os revelou. As pessoas sempre tiveram essas tendências, só viram no solo fértil das redes a possibilidade de germinar.
Hoje não se sabe como promover a desintoxicação jihadistas digitais, mas já vimos que existe a possibilidade dos conflitos migrarem do simbolismo da rede para o mundo físico. Agressores e agredidos têm suas explicações e não conseguem, muitas vezes sozinhos, chegar a convivência harmoniosa. Com o fim do Apartheid, a África do Sul teve que encontrar esse caminho. Talvez o Reverendo Desmond Tutu tenha que vir nos dizer como conciliar pessoas no princípio da verdade. Mas uma coisa é certa: ainda existem dedos no teclado sedentos por disparar, não pela necessidade de guerra, mas ânsia de combate. Assim como qualquer droga a guerra digital vicia, quando ela acaba causa abstinência e como qualquer droga deixa a abstinência dolorosa.