Por Michel Gralha, advogado
“A insegurança e o perigo que habitam as ruas de Porto Alegre me mantêm trancafiada dentro do meu apartamento e deste pensamento, de certa forma egoísta, de que todos os homens que pedem esmola nas sinaleiras vão sacar uma arma e me assaltar. Por causa deste medo, compartilhado por muitos porto-alegrenses, não damos nenhuma esmola para esta pessoa faminta. Como podemos esperar que algo melhore?”
O trecho acima não foi escrito por mim e, sim, por uma menina chamada Helena, de 12 anos. O direito à percepção lúdica do mundo das crianças está sendo substituído por pequenos ou enormes traumas que a insegurança das nossas ruas tem causado. São tantas histórias contadas e vividas que nos esquecemos dos tempos de tranquilidade, em que transitávamos sem preocupações. Infelizmente, passado! Deixamos tudo isto para trás e nossas vidas viraram uma constante vigilância. Somos sobreviventes de uma guerra civil, rodeados de violência por todos os lados.
A vida, para alguns, perdeu o valor. E o respeito, para muitos, base de tudo que podemos construir como ser humano, esvaziou-se nas redes sociais. São ameaças e agressões físicas e verbais. Estamos vivendo o tempo do xingamento/agressão, filmagem e postagens, com traumas a todos e sem que as novas gerações consigam elaborar tanta informação negativa. Retraem-se com o efeito fantasioso e ameaçador de um pedido de esmola e sucumbem emocionalmente com o ataque a um candidato à presidência da república. Triste momento o que vivemos. Perderam-se valores básicos e a esperança.
Passamos, legitimamente, a desconfiar das nossas instituições democráticas, quando tornou-se supostamente “defensável” agredir, por discordâncias ideológicas. Trata-se da violência como reflexo de uma sociedade violentada. E não pensemos nós que a responsabilidade é, apenas, das autoridades públicas ou que os cidadãos não têm responsabilidade pelo estado atual das coisas. Pelo contrário, muito do que temos hoje e passamos às nossas crianças são exemplos do nosso comportamento. Precisamos repensar, transigir e aceitar que boas ideias e boas ações podem mudar a forma das novas gerações escrever e descrever o mundo.