O poder alcançado pelas facções no Rio Grande do Sul, como demonstra reportagem do Grupo de Investigação da RBS (GDI) que está sendo publicada até amanhã, chama a atenção para o quanto o crime organizado se enraizou no cotidiano dos gaúchos e para a rapidez com que seus atos se internacionalizam. De tanto conviver com a violência no dia a dia, a sociedade gaúcha já se mostra anestesiada, sem disposição de reagir para deter o seu avanço. Ainda assim, essa é uma ameaça com a qual nem a população, nem o poder público, que tem o dever de protegê-la, podem se conformar, pois o risco é a perda absoluta de controle da situação.
Criminosos, organizados em gangues que atuam livremente até de dentro de presídios, já não se limitam a operações habituais como tráfico de drogas e de armas. Diante da necessidade de lavar dinheiro, ampliam rapidamente sua presença no comércio, em áreas que vão desde lanchonetes até revenda de carro de luxo. Não satisfeitos, avançam na cobrança de "pedágio", extorquindo quem atua em áreas como agências lotéricas e até mesmo na entrega de serviços essenciais.
Na dificuldade cada vez maior de atuação do poder público, o crime organizado tem condições hoje de decidir se uma escola pode ou não funcionar e de intimidar até mesmo o funcionamento de um fórum, como já se constata na Capital. Esse poder manifestado internamente preocupa ainda mais pelo fato de os seus tentáculos estarem se consolidando, com o avanço em direção a países vizinhos, onde se valem de facilidades legais e da colaboração de policiais para adquirir armamento pesado. Fica cada vez mais claro que, sem limites para atuar e com poder superior ao das forças de segurança, o crime se estrutura hoje de forma que vai muito além de corporação, transformando-se em organização com hierarquia e alcance internacional.
A população pode fazer a sua parte para combater esse avanço, negando-se, por exemplo, a contribuir para o fortalecimento dessa rede de lavagem de dinheiro. Um supermercado que vende mercadoria por valores muito abaixo dos praticados no mercado, como ocorria em uma cidade da Região Metropolitana, só pode fazer isso porque trabalha com produto roubado. Ou o poder público se mobiliza com os recursos de que dispõe, convocando a sociedade para deter o avanço do crime organizado, ou os gaúchos terão em breve o seu dia a dia totalmente dominado pelas facções.