Por Cristiane Avancini Alves, doutora em Direito
Fotos e áudios recentes consternaram a comunidade internacional quanto à separação de pais e filhos na fronteira dos Estados Unidos com o México. Os áudios revelam a tristeza e o desespero de crianças que são, sumariamente, levadas para estruturas que se assemelham a verdadeiras gaiolas humanas. As fotos publicadas em diversos meios de comunicação mostram essas estruturas, que chocam nosso olhar e arrepiam nossa memória, não apenas pela desumanidade e crueldade direcionada àqueles que sofrem essa ação – as crianças –, bem como por nos remeterem ao fim da Segunda Guerra Mundial, quando milhares de pessoas foram encontradas em campos de concentração. Ainda que haja o abrandamento dessa política pelo governo dos EUA, é paradoxal pensar que, em pleno século 21, e em um dos países precursores da Carta da ONU de 1945, esse cenário é manchete no noticiário internacional.
Na sequência de atos do pós-guerra, foi emanada, pela ONU, a Declaração Universal de Direitos Humanos. Em 2018, celebram-se os 70 anos deste documento, tido, segundo as Nações Unidas, como o mais traduzido no mundo. Outro paradoxo. O documento mais traduzido no mundo tem sido equivocadamente interpretado quando nos deparamos com os fatos acima narrados. A violação aos direitos humanos repete-se, também, em outro deturpado cenário: a publicação de vídeos de torcedores brasileiros na Copa do Mundo da Rússia, que incentivaram nacionais russas a expressarem palavras obscenas sem conhecimento de seu real significado. Poucos sabem que, em 1945, uma mulher, brasileira, foi fundamental para a menção à igualdade entre homens e mulheres na Carta da ONU. A cientista brasileira Bertha Lutz, com a ajuda de delegadas do Uruguai, México, República Dominicana e Austrália, reivindicou a inclusão da defesa dos direitos das mulheres na Carta e a promoção da igualdade de gênero.
Na passagem do tempo entre a coragem de Lutz e as lágrimas de crianças separadas de seus pais em pleno desrespeito aos direitos humanos, clama-se pela efetivação de paz e de liberdade, e não por gaiolas que aprisionam, nestes contextos, a dignidade de cada um de nós.