Recentemente, vemos inusitada atenção de importantes setores nacionais aos salários da magistratura. Enquanto se comparam profissões e redescobrem-se parcelas, acobertam-se significados e, principalmente, as efetivas ambições envolvidas.
Não temos o direito de evitar a pergunta: por que juízes, no espaço de uma semana, passaram de heróis a vilões da República?
Por que juízes, no espaço de uma semana, passaram de heróis a vilões da República?
RODRIGO TRINDADE DE SOUZA
Presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da IV Região
É da essência da magistratura contrariar interesses dos poderosos e os estudiosos chamam isso de poder contramajoritário. O combate à corrupção e ao abuso do poder econômico ocorre diariamente nos julgamentos, mas também passa pela atuação das associações de juízes, sempre atentas ao combate à corrupção e a temas áridos como o trabalho infantil, escravidão e reforma trabalhista.
Contrariar interesses poderosos custa caro. Na absoluta falta de fatos gerais e concretos de más condutas, auxílio-moradia foi pinçado como tópico preferido. Convenientemente, esquece-se que se trata de parcela definida em lei desde 1979, integra rol de benefícios de carreira selecionada apenas pelo mérito e que se liga à característica profissional de transitoriedade de domicílio. É saudável à democracia pensar critérios diferentes, mas sempre seguindo o trâmite legislativo e analisando o amplo conjunto de agentes de Estado que também recebem, sob criativas denominações.
Não podemos ser ingênuos. A magistratura nacional já conta com déficit de mais de 40% no subsídio e submete-se a severos e incomparavelmente desproporcionais regimes fiscal e previdenciário. Trata-se da única categoria que, reiteradamente, tem reajustes inflacionários negados pelo parlamento.
Cumpre, sim, inquirir o porquê desse súbito despertar de moralidade e a quem serve a difamação de uma das únicas estruturas de Estado que ainda conseguem combater os piores males nacionais: a corrupção e o abuso do poder econômico. Isso é impossível sem bons profissionais, bem sabem os que, hoje, se tomam incorporados da fúria demagógica. Não há coincidências.