O impasse enfrentado pelo setor público gaúcho em consequência da opção, no passado, por critérios desconectados da realidade sobre o cálculo das despesas com pessoal é uma questão para a qual é preciso encontrar logo uma saída negociada. Sem uma mudança no cálculo adotado há 17 anos, depois da entrada em vigor da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o governo do Estado não poderá aderir ao regime de recuperação fiscal em negociação com o governo federal. Se a interpretação, conveniente na época, é rejeitada em Brasília, não há como assegurar a pretendida suspensão do pagamento da dívida por três anos.
No início dos anos 2000, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) decidiu excluir do cálculo final gastos com pensões e com auxílios em geral. A Secretaria do Tesouro Nacional (STN) exige hoje um mínimo de comprometimento de 70% da receita na soma de gastos com servidores e desembolsos da dívida para que o Estado se habilite ao socorro federal. O próprio TCE, diante de uma consulta formulada pelo Palácio Piratini, chegou à conclusão de que o comprometimento atual limita-se a 54,94%. Se o cálculo for revisto para permitir o fechamento do acordo, porém, o impacto será inevitável sobre outros poderes. Há o risco de que tenham seus limites estourados e fiquem impedidos de fazer novas contratações. Prefeituras também sofreriam consequências, pois seguem o mesmo padrão.
O fato concreto é que, ao desconsiderar gastos com pensões e diferentes tipos de auxílio ao funcionalismo, a decisão adotada para evitar punições aos gestores públicos acabou desinflando as despesas de pessoal. Trata-se, portanto, de um arremedo antigo para burlar a legislação. O raciocínio é simples. Todos os gastos expurgados estão associados a pessoal. Se houver mais funcionários, esses gastos sobem. Se houver menos, eles caem, como em qualquer empresa do mundo. Então, despesas com servidores que há muito tempo vêm sendo ignoradas, por razões casuísticas, precisam, para todos os efeitos, ser consideradas gastos com pessoal.
A Lei de Responsabilidade Fiscal já deveria estar sendo aplicada há muito tempo no setor público gaúcho. Dispêndios bancados por recursos dos contribuintes gaúchos precisam ser tratados com mais transparência e realismo para que a contabilidade oficial se mostre mais confiável.