"O drama nos paralisa e a tragédia nos transforma." Não lembro ao certo se essa frase vem de um romance de Balzac ou Oscar Wilde, ou ainda de algum filósofo oitocentista, mas ela ajuda a dar um sentido aproximado do momento pelo qual passa a esquerda brasileira. Presos ao centro gravitacional que reclama a figura de Lula (PT), a parte competitiva dela não tem conseguido a independência necessária para revitalizar seu discurso e cimentar a imagem de novas lideranças para a cena eleitoral brasileira.
O problema se encontra na incompreensão da necessidade de fazer a transição para uma realidade eleitoral completamente diferente daquela que levou à experiência da coalizão petista. Com o processo de redemocratização e consolidação dos ciclos eleitorais, se tornou condescendente uma gravitação em torno da liderança que Lula representava com a possibilidade real de chegada ao poder. O preço dessa capitulação ainda não foi considerado.
Pode ser um momento oportuno para que as lideranças e partidos que gravitam em torno da figura de Lula busquem a emancipação.
Figuras como Ciro Gomes, Heloisa Helena, Marina Silva e tantos outros tiveram seus potenciais políticos eclipsados em consequência dessa gravitação. Não só foram constrangidos a uma coalizão que os tornavam intimamente dependentes dos recursos do Estado como também dela dependia todo o sentido criativo de suas narrativas. Hoje ainda, lideranças com bons potenciais como Fernando Haddad e Flávio Dino ofuscam-se na dramatização representada pela imagem do petista, ficando limitados, a contento, por defenderem sua candidatura.
O julgamento de Lula no TRF4 pode trazer consigo a necessidade de transformação de que a esquerda brasileira precisa, porque uma autocrítica franca pode renovar suas já desgastadas narrativas. Pode ser um momento oportuno para que as lideranças e partidos que gravitam em torno da figura de Lula busquem a emancipação. O recado dado nas urnas no pleito de 2016 foi sugestivo, todavia boa parte da esquerda brasileira permanece presa a um arranjo político que ficou no passado. O novo caminho a ser percorrido é desafiador, afinal, sem Lula o vácuo de poder entre as esquerdas só aumenta.