O problema central do livro A República, escrito por Platão* já faz um bom tempo (século 4 a.C.), é a moralidade de um governo.
A sociedade perfeita, tal qual descrita pelo imortal grego, dependia de trabalhadores, escravos e comerciantes. Já a classe guardiã era a responsável por proteger a cidade. Platão afirma: os próprios guardiões irão se proteger deles mesmos. Percebe-se facilmente a conexão da obra e da frase com as históricas tentativas de as civilizações modernas e democráticas atacarem o problema (insolúvel?) de uma eventual falta de moralidade de seus guardiões através da ferramenta político-legal da separação dos Poderes.
A ideia central é nunca deixar relevante parcela de poder ficar concentrada na mão de um determinado grupo (Executivo, Legislativo, Judiciário), que poderia se unir em torno de seus interesses comuns e com isso ignorar o dever cívico e humanitário de "guardar os irmãos em necessidade".
Bem, a julgar pelo horripilante espetáculo televisionado na última quarta-feira, não está funcionando a saída proposta por Platão.
Peguemos o caso da modificação da tributação do PIS/Cofins sobre a gasolina e veremos que, nesse caso, tivemos (i) uma metodologia de cálculo complexa, que dificulta o controle direto da população sobre a moralidade da tributação; (ii) o congresso permite a passagem a uma legislação que lhe retira parte de seu poder de legislar e o transfere ao Executivo, que agora pode modificar a forma de tributação a seu bel prazer; (iii) que esse mecanismo potencialmente inconstitucional foi questionado pela Procuradoria-Geral da República através de Ação Direta de Inconstitucionalidade, sobre a qual um ministro indicado por um presidente da República não parece ter pressa para julgar...
O Brasil do século 21 vive inegavelmente uma crise moral e institucional. Um novo pacto federativo e uma mais transparente e rígida separação dos Poderes se fazem necessários.
Quis custodiet ipsos custodes? O povo brasileiro!?
*O autor do livro A República é Platão e não Sócrates, como publicado até as 16h40min deste domingo (6). O texto já foi corrigido.