Mário de Andrade escreveu que "o passado é lição para refletir, não para repetir", mas, após 20 anos da privatização parcial da CEEE, parece que não aprendemos a lição.
Sob nossos veementes protestos, dois terços da área de distribuição foram vendidos em 1997. Foi-se a receita, ficaram as dívidas. Grupos americanos compraram os ativos e surgiram a AES-Sul e a RGE, recentemente adquiridas pela gigante estatal chinesa State Grid. Ingressaram nos cofres públicos, à época, R$ 3,1 bilhões, que, corrigidos, chegam hoje a R$ 54 bilhões! A montanha de dinheiro não resolveu os problemas. Pior. Eles se agravaram. É que não se resolve crise vendendo patrimônio, ainda mais rentável, como o da CEEE, que, ao contrário do que dizem, é uma empresa viável.
Considerando as áreas de geração, transmissão e distribuição, números oficiais mostram lucro do grupo CEEE de quase R$ 400 milhões em 2016. Não é honesto apresentar, isoladamente, apenas os resultados da área de distribuição, onde há prejuízo porque o Estado abriu mão, lá atrás, da receita necessária ao equilíbrio da operação. Mesmo assim, a CEEE-Distribuição em nada perde para as concorrentes privadas. Pratica tarifa 17% menor do que a da AES Sul e 5% inferior à da RGE, além de ter nível de satisfação dos consumidores superior a 80%.
A questão é ideológica. Embora os 20 anos de atuação, lado a lado, de uma empresa pública e duas privadas comprovem que o mantra neoliberal de que tudo que é privado é melhor e mais barato é uma falácia, continuam querendo privatizar.
É inadmissível que o governo federal exija, em troca do socorro, a privatização dos setores financeiro, elétrico e de saneamento dos Estados, um garrote que fere de morte o princípio federativo. Temos que resistir.
Como ex-presidente da CEEE (governo Collares – 1992/93) e autor da emenda à Constituição que estabeleceu a obrigatoriedade de plebiscito para a venda de ativos do Estado, conclamo os gaúchos a se mobilizarem contra a subserviência e insensatez que representaria abrirmos mão de uma empresa símbolo, que tanto contribui para o desenvolvimento do Rio Grande do Sul.