Nos últimos dias, aliados do governo colocaram um investigado para presidir a Comissão de Constituição e Justiça do Senado, o presidente Michel Temer concedeu foro privilegiado para um alvo da Lava-Jato e indicou para o Supremo um advogado-político-tucano para ocupar a vaga deixada por um jurista-técnico-independente. Tudo ocorre às vésperas de as delações dos 77 executivos da Odebrecht se tornarem públicas – em outras palavras, antes que o mundo acabe.
Os conchavos deixaram os gabinetes. São feitos às claras. Diz-se uma coisa, faz-se outra. O presidente anuncia que não vai tolerar malfeitos: serão afastados ministros que se tornarem réus na Lava-Jato. Perfeito, não fosse um detalhe: em três anos de operação, não enchem duas mãos os políticos réus no Supremo. O anúncio feito em cadeia nacional soou como uma espécie de salvo-conduto para auxiliares suspeitos. Quem se importa? O povo, hipnotizado, deixou as ruas. Silenciaram-se as panelas.
A mais surpreendente das decisões de Temer envolve Moreira Franco, amigo e aliado de longa data. O ex-governador do Rio, que teria a alcunha de "Angorá" no submundo da corrupção, deixa a função de secretário-executivo do Programa de Parcerias de Investimentos para exercer o cargo de ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República – ganha foro privilegiado e escapa dos investigadores de Curitiba e do juiz Sergio Moro.
No apagar das luzes, a presidente Dilma fez algo parecido: nomeou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a Casa Civil, investigado na Lava-Jato, mas o ministro do STF Gilmar Mendes barrou a posse. No despacho, Mendes escreveu:
"É muito claro o tumulto causado ao progresso das investigações, pela mudança de foro. E 'autoevidente' que o deslocamento da competência é forma de obstrução ao progresso das medidas judiciais...". Eram outros tempos.
Embora sob intensa artilharia, a Lava-Jato, até agora, mantém-se em pé. Uma decisão importante e que pode influenciar o futuro da operação, porém, será tomada nos próximos dias. Trata-se da escolha do novo ministro da Justiça, a quem a Polícia Federal se subordina. Os ministros que se sucederam na pasta jamais ousaram "estancar a sangria" provocada pela operação, que segue independente e devastadora. Temer chamou para si a decisão. Informou que o sucessor de Alexandre de Moraes será alguém da "sua confiança", da cota pessoal da Presidência. O escolhido merecerá a confiança dos brasileiros? O futuro responderá.