Muitas das críticas não levam em conta que a política, assim como todas as atividades competitivas do tipo vitória-derrota, admite um padrão de conduta distinto daquele aceito nas relações entre familiares, amigos e colegas.
No futebol profissional, por exemplo, é comum derrubar o adversário e usar os braços para se por em vantagem na disputa pela bola. A Ultimate Fighting Championship (UFC) permite que um lutador dê um pontapé na cabeça de outro.
A política admite "truques do ofício". É dever do político saber jogar o jogo, conhecer os truques. Como disse Ulysses Guimarães referindo-se aos seus colegas deputados: "Aqui não tem bobos! Os bobos ficaram na suplência!"
O debate sobre a ética da política diferente da ética fora dela inclui necessariamente autores como Norberto Bobbio (1909-2004) e Max Weber (1864-1920). Bobbio alerta que a ética da política tem de ser pensada a partir do fato de que o objetivo da ação política é o poder pelo poder. Weber fazia a distinção entre a "ética da convicção", aquela dos princípios reconhecidos em cada sociedade, e a "ética da responsabilidade" que a função exigiria. Mentira "em prol do interesse nacional" estaria dentro da "ética da responsabilidade". John Mearsheimer, professor de ciência política da Universidade de Chicago, pesquisou o assunto e concluiu que algumas "mentiras estratégicas" tem um "mínimo de legitimidade".
Além da mentira é comum o emprego da omissão. Omitir, omittere em latim, consiste no ato de não mencionar ou de deixar de dizer com a intenção de esconder. Convém reconhecer: também praticamos a omissão numa ou noutra situação de nossas vidas.
Há um nível tolerável de desonestidade em todos nós, como bem já constatou Dan Ariely. Quando inseridos em atividades nas quais ou se ganha ou se perde, o nível tende a aumentar.
A crítica é realista, portanto, quando leva em conta as peculiaridades do meio. Hoje lamentamos, e com razão, o aumento muito além do tolerável do nível de desonestidade. Baixar esse nível é tarefa de todos nós e não só dos bons políticos, dos outros poderes constituídos e da imprensa.
A política não é para "bobo". É para "lobo". Devemos combater o "lobo mau". Só ele. Se "acabarmos com a classe", como querem alguns, quais alternativas teremos? A bota de um militar a nos oprimir? O governo de um religioso fanático a nos impor suas verdades medievais?
Precisamos defender os políticos.