Depois de quatro derrotas eleitorais, os partidos liberais e ex-progressistas transitaram da estratégia política de conteúdo programático de ideário neoliberal para a lógica de interditar a qualquer custo e derrubar, pela via golpista, a presidenta eleita por 54 milhões de brasileiros, renunciando à ordem democrática.
Processualmente setores democráticos e progressistas que inicialmente defenderam, nas ruas, o combate à corrupção e aos desvios de condutas, perceberam que a fórmula lacerdista não reservava o mesmo peso para toda a representação política brasileira. E que, para se completar, necessitava de uma postura antirrepublicana com as instituições e de agressão aberta à legalidade constitucional e ao Estado de direito.
Visava, ainda, acabar com os direitos trabalhistas e as conquistas advindas de lutas históricas. Usava a surrada tática dos "fins justificam os meios" e, através de uma maioria casuística na Câmara e no Senado, construía o impichamento da presidenta, mesmo que sem a materialidade de crime de responsabilidade, na busca ao poder inalcançado nas urnas.
Minimamente rigorosos, vemos que a insanidade é tanta, que o país está jogando no ralo a árdua reconstrução democrática, que tanto nos custou. Revela-se claramente que, neste processo, os partidos que aderiram ao golpismo são apenas aríetes de um plano maior unificado. Comandado de forma articulada por poderosas forças orgânicas numa grande frente funcional, orienta-se por interesses pouco republicanos de setores empresariais-midiáticos-judiciais, para os quais a questão democrática não tem um valor universal.
Deve ser responsabilizada, por ferir de morte o Estado de direito, essa grande aliança dos liberais desertores do jogo democrático, de entidades empresariais que jogam pesado para terem seus objetivos alcançados, da mídia monopolizada que edita e constrói uma narrativa de forma parcial e tendenciosa e de um Judiciário que renunciou a seu papel técnico e virou um espaço de politização pura.
Abre-se, pois, um enorme precedente na frágil democracia brasileira: diante de uma gestão com baixa avaliação, uma maioria parlamentar circunstancial autoriza-se a interromper qualquer governo, legitimando a via golpista.