Num inflamado discurso de campanha em 17 de outubro, o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, referiu-se com desprezo aos líderes de oposição que haviam recusado seu convite para uma reunião de diálogo no novo palácio presidencial. "Cedo ou tarde, vocês virão - como cordeiros. Vocês não podem fazer outra coisa senão vir", vociferou.
Ontem, apurados mais de 95% dos votos da segunda eleição parlamentar turca em menos de seis meses, a ameaça velada adquiriu nova conotação. O Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP, que se pronuncia A-Quê-Pê em turco), de Erdogan, garantiu 49,4% dos sufrágios. Essa votação dá à sigla do presidente pelo menos 316 cadeiras no parlamento.
Mas é na comparação com o pleito anterior, de 7 de junho, que o resultado ganha um contorno formidável para Erdogan. Naquele dia, o AKP garantiu apenas 40,8% dos votos. Foi castigado pelo descontentamento dos eleitores com a crise econômica, com a guerra na Síria e com os escândalos de corrupção e traços autoritários do governo.
O grande vencedor de junho havia sido um partido recém-criado, o HDP, pró-curdo, que logrou ultrapassar a cláusula de barreira de 10% dos votos e assegurar 70 cadeiras. Ontem, o HDP despencou dos cerca de 13% de junho para pouco mais de 10%.
A reação eleitoral de Erdogan não foi casual. Desde junho, seu governo ameaçou a oposição, prendeu jornalistas e voltou a atacar alvos dos guerrilheiros do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) no Iraque. O objetivo era claro: apelar ao medo e ao nacionalismo turca. Conseguiu recuperar os votos perdidos em junho, mas terá dificuldades para atrair a oposição ao palácio.
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