Por Ricardo Gandour, jornalista e membro do Conselho Editorial da RBS
A expressão inteligência artificial (IA) tem dominado as conversas e os debates em vários campos do conhecimento, de contextos e atividades – nas escolas, nas empresas, nas instituições de pesquisa e também nas redações das empresas jornalísticas. Aqui, vem a pergunta: qual pode ser o impacto dessas novas tecnologias na produção de informações?
A mais conhecida ferramenta é o ChatGPT, lançada em novembro do ano passado pela empresa americana OpenAI. Mas o uso de software na confecção de textos informativos já se conhece pelo menos desde 2015, quando a agência de notícias Associated Press começou a experimentar a novidade na cobertura do sobe e desce dos preços das ações nos mercados de capitais. Logo depois, as mesmas técnicas foram utilizadas para se construir relatos básicos sobre o andamento de jogos de futebol. Tudo muito lógico: dados objetivos que, analisados em sequência, se transformam em textos corridos.
Nesse ponto, a grande discussão é se uma possível automação da produção de conteúdos poderá ser destruidora de empregos – isso em várias atividades, não só no jornalismo
A resposta àquela pergunta poderá vir desse simples substantivo: ferramenta. É sob esse atributo que cada tecnologia foi se incorporando ao dia a dia da produção jornalística. Foi assim com o telex, o fax, a fotografia digital, o design e a diagramação de páginas e de telas. Agora, porém, há uma grande diferença. Enquanto as novidades das últimas décadas mexeram com a forma, o meio e a velocidade dos processos de produção, a IA vem tocar no objeto central de nossa atividade, o conteúdo – não só de textos, mas também de imagens.
Nesse ponto, a grande discussão é se uma possível automação da produção de conteúdos poderá ser destruidora de empregos – isso em várias atividades, não só no jornalismo. Não acredito nessa hipótese, assim, de forma simplista, mas em outra, mais ampla: poderá, sim, transformar ocupações, talvez simplificando algumas, mas certamente criando demandas para novas habilidades. A história nos mostra que a mão e o cérebro humanos sempre prevalecerão ao longo dos processos de trabalho. Um software poderá, sim, criar um texto a partir de dados disponíveis na websfera – de forma resumida, é isso o que faz a IA – mas a interpretação do contexto e a subjetividade serão sempre atributos humanos.
E que isso venha para fazermos um melhor jornalismo, mais eficiente e sobretudo mais preciso. Como escreveu Jack Shafer, colunista de mídia do site americano Politico, na Columbia Journalism Review: “se a IA vier para melhor servirmos nossos leitores, deveria ser muito bem-vinda”.
Para angústias digitais, reflexões analógicas.