A rebelião frustrada do grupo paramilitar Wagner na Rússia provocou a pior crise enfrentada pelo presidente Vladimir Putin desde a chegada ao poder. Alguns pontos seguem sem resposta.
Onde está Prigozhin?
A última aparição do chefe do Wagner, Yevgueni Prigozhin, foi na noite de sábado (24), quando deixou, entre aplausos dos habitantes, a cidade russa de Rostov, onde havia tomado o controle de um quartel militar.
O governo da Rússia assegurou que o líder dos paramilitares tinha "a palavra" de Putin para deixar o território russo até Belarus, país aliado dos russos, e que não seria acusado criminalmente.
Nesta segunda-feira (26), contudo, uma fonte de Procuradoria-Geral russa, citada pelas três principais agências de notícias do país, afirmou que "o caso não havia sido encerrado, a investigação continua".
O blogueiro militar russo Michael Nacke acredita que Prigozhin instalará a base do Wagner em Belarus e continuará as operações de seu grupo na África.
— Porém, Prigozhin se tornou um alvo extremamente vulnerável: pode ser preso, pode ser morto — disse à AFP.
Também nesta segunda, o líder do Wagner divulgou, um áudio, de 11 minutos, em que fala sobre a rebelião:
— O objetivo da marcha era não permitir a destruição do grupo Wagner. Não era derrubar o poder no país — afirmou, sem revelar a própria localização.
Qual o futuro do Wagner?
Prigozhin lançou uma insurreição armada dias depois de Putin anunciar que os combatentes do Wagner deveriam assinar contratos com o Exército.
— Querem desmantelar o grupo — denunciou Prigozhin no sábado.
O governo russo disse que os homens que seguiram seu líder na rebelião não seriam acusados criminalmente, em agradecimento a seus esforços na Ucrânia, ou, "se desejassem", que poderiam fazer parte do Exército.
Wagner afirmou nesta segunda-feira que sua principal sede, em São Petersburgo, funcionava "com normalidade de acordo com a legislação da Federação Russa".
— O Wagner poderia ser desmantelado completamente ou mesmo absorvido pelo Exército — estima Michael Kofman, especialista militar estadunidense.
— Putin não precisa do Wagner, ou de Prigozhin. Pode se virar com suas próprias forças. Agora está totalmente convencido — comenta a analista independente russa Tatiana Stanovaya.
Quais as consequências para a cúpula militar?
O objetivo oficial da rebelião de Prigozhin era a substituição do ministro da Defesa, Serguei Shoigu, e do chefe do Estado-Maior, Valeri Guerasimov. Até o momento, Putin não anunciou nenhuma mudança na cúpula militar.
Imagens da televisão estatal russa nesta segunda-feira mostraram Shoigu inspecionando suas tropas na Ucrânia, em sua primeira aparição após a insurreição de 24 horas. Guerasimov não apareceu em público até agora.
"Sob pressão (de Prigozhin), Putin não fará nada", estima no Telegram o cientista político pró-Kremlin Serguei Markov.
Para Rob Lee, do think-thank americano Foreign Policy Research Institute, os últimos acontecimentos "dão a impressão de que Shoigu e Guerasimov eram fracos, mas também mostram até que ponto é importante para Putin ter pessoas leais encarregadas de seus serviços militares e de segurança".
Prigozhin atuou sozinho?
Um fato é incontestável: os combatentes do Wagner conseguiram, em 24 horas, tomar o controle de parte de Rostov, com 1 milhão de habitantes, e se aproximar até 400 quilômetros de Moscou, ou até 200 quilômetros, segundo Prigozhin.
O líder do Wagner, que assegurou que tomou a base militar de Rostov "sem um único disparo", teve ajuda interna, como alguns pensam? Ou agiu ao perceber que o cerco em torno de seu grupo estava se fechando?
As declarações do primeiro chefe adjunto do serviço de inteligência militar russo (GRU) levantaram dúvidas. Em um vídeo publicado no sábado, Vladimir Alekseyev insta os homens do Wagner a abandonarem sua rebelião, ao mesmo tempo que parece debochar de Shoigu e Guerasimov.
— Leve-os — disse com um gesto das mãos.
Qual o impacto para a ofensiva na Ucrânia?
O governo russo assegurou que estava "fora de questão" afetar a ofensiva militar na Ucrânia com o motim. Porém, o certo é que poderia impactar o moral dos soldados russos, segundo analistas, que enfrentam ondas de ataques ucranianos há semanas.
O grupo Wagner representava uma das forças mais combativas nas fileiras russas e estava na linha de frente da longa batalha de Bakhmut.
— No terreno, porém, desde a tomada de Bakhmut em maio, o Exército dependia menos do Wagner. Ele não era utilizado para a defesa no sul, uma das principais regiões nas quais as tropas de Kiev tentam avançar entre a defesa russa — afirma o analista militar Michael Kofman.