Citada como exemplo no combate à pandemia de coronavírus, a Alemanha pode colocar seus esforços a perder se retirar muito rápido as restrições à circulação, disse a premier do país, Angela Merkel, nesta quinta-feira (23). No início desta semana, o país permitiu que lojas com até 800 metros quadrados voltassem a funcionar. Livrarias, bicicletarias e concessionárias de qualquer tamanho também foram liberadas.
No entanto, as 16 regiões administrativas alemãs têm relativa autonomia para implantar ou flexibilizar as medidas, e Merkel teme que algumas delas estejam retomando as atividades rápido demais. Alguns estados autorizaram a abertura de lojas maiores, desde que o espaço interno estivesse limitado. Outros liberaram lojas de jardinagem e bricolagem, independentemente do tamanho. Na região mais populosa da Alemanha, a Renânia do Norte-Vestfália, lojas de móveis voltaram a funcionar livremente.
Em discurso a parlamentares, Merkel disse estar preocupada com a "implementação" da saída da quarentena. Segundo a premier, o país ainda "caminha sobre gelo muito fino" e a população ainda terá que viver com medidas de contenção de transmissão por muito tempo:
— Em algumas partes do país ela está sendo brusca, para não dizer muito brusca. (...) Não estamos na fase final desta pandemia, mas no começo — afirmou.
Na imprensa alemã, especialistas em epidemias criticaram o governo por não comunicar com o cuidado necessário a retirada de algumas restrições, passando a mensagem de que a vida está voltando ao normal. Com cerca de 150 mil casos confirmados de coronavírus, a Alemanha tem o quinto maior número do mundo, atrás dos Estados Unidos, de Espanha, Itália e França, mas com taxas de contágio e mortalidade menores.
São 180 casos confirmados por 100 mil habitantes, enquanto a Espanha tem 455 e a Itália, 410 casos por 100 mil habitantes. Na Alemanha, 6,3 pessoas morreram para cada 100 mil habitantes, menos de um quinto das mortes registradas na Espanha (47), na Itália (42) e na França, com 33 mortes por 100 mil habitantes.
Ainda que não tenha sido um dos países europeus que mais cedo implantou o lockdown, a Alemanha conseguiu conter a transmissão da doença com uma alta capacidade de testes, que chegou a 100 mil por dia nesta semana, e de isolamento.
Segundo o instituto nacional de saúde, a taxa de contágio alemã está um pouco abaixo de 1, ou seja, cada pessoa infectada transmite a doença para menos de uma pessoa. A redução da mortalidade também se deve ao fato de o sistema de saúde alemão ser o mais bem equipado da Europa, com a maior taxa de leitos hospitalares e em UTI por habitante do continente.
No plano de retomada anunciado pelo governo alemão, algumas escolas devem ser reabertas no dia 4 de maio. Restaurantes, bares e estabelecimentos que reúnem muitas pessoas por mais tempo, como academias de ginástica, teatros e cinemas, continuam fechados. Eventos estão proibidos até pelo menos 31 de agosto.
— Precisamos mostrar o máximo de resistência e disciplina, para não ter que ficar passando de um lockdown para outro — disse Merkel aos parlamentares.
Maior economia da Europa, com Produto Interno Bruto (PIB) de mais de 3,9 trilhões de euros (cerca de R$ 23 trilhões) em 2018, a Alemanha teve sua atividade duramente atingida pela pandemia, mostram indicadores divulgados nesta quinta. Os índices de serviços e atividade indústrial calculados pela IHS Markit caíram para o menor nível desde que o indicador começou a ser medido, há mais de 20 anos.
O índice que mede a intenção de compras de serviços das empresas ficou em 15,9 em abril, cerca da metade dos 31,9 de março (quando está abaixo de 50, indica que a maioria das empresas espera retração). Três quartos das empresas relataram queda na atividade. O de produção industrial também teve baixa recorde, chegando a 19,4 em abril, contra 41 em março.