A escola de atores Elite Acting, que é alvo de reclamações e processos judiciais de mais de 70 ex-alunos por descumprimento de contrato, já havia sido investigada em inquérito civil do Ministério Público em 2021, após denúncia sobre a forma de captar alunos. À época, uma mulher procurou a Promotoria Especializada no Direito do Consumidor para relatar que teria sido "vítima de golpe" da empresa após o filho ter sido chamado via redes sociais para uma audição.
Na denúncia protocolada pela internet, a mulher relatou que "a empresa busca nas redes sociais pais de crianças e marcam audição para um curta e um comercial" e "informam que não vão cobrar valores (...), porém, quando os pais chegam com a criança para a audição, a conversa muda: informam que, para dar continuidade no projeto, a criança deve pagar um curso de mais R$ 3 mil".
O inquérito terminou com um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), em que a escola se comprometeu a deixar claro que a participação de clientes em audições, filmes e peças está condicionada à realização de curso. Em caso de descumprimento, a multa imposta pelo MP seria de R$ 5 mil, que seriam recolhidos ao Fundo Estadual de Reconstituição dos Bens Lesados.
Naquela ocasião, a escola era registrada sob o CNPJ Elite Acting Produta de Filmes Ltda, de propriedade de Robson Arenhardt. O endereço era a Rua dos Andradas, 1.091, nono andar, sala 91. A escola, tempos depois, passou a firmar contratos como Acting Filmes, com propriedade de Letícia Medianeira Lima da Silva, com o mesmo endereço. Letícia é esposa de Robson. Nos contratos fechados pelos alunos que procuraram o GDI para relatar o ocorrido, o carimbo ainda era da escola Elite Acting.
O MP foi procurado nesta segunda-feira (19) pelo GDI sobre as novas reclamações de consumidores e ainda não retornou.
O advogado Henrique Caporal Pereira, responsável pelo jurídico da escola Elite, disse que "a empresa na época prestou todos os esclarecimentos e ajustou o termo de conduta com o MP, não havendo qualquer ilegalidade nisto, uma vez que o ajuste previa apenas uma correção texto no contrato de prestação de serviço".
Mais pessoas se sentem vítimas
Após a reportagem publicada na última sexta-feira (16), que mostrou já haver mais de 70 processos na Justiça com pedidos semelhantes contra a empresa, outras 10 pessoas procuraram o GDI afirmando serem vítimas da escola. Ao todo, o grupo de investigação já recebeu o relato de 50 pessoas. Todos são semelhantes: teriam sido convidadas para testes de elenco, mas teriam que pagar por um curso para desenvolver melhor seu talento artístico, e firmaram contrato com a escola que prometia incluir os alunos em peças de teatro e filmes, o que não teria acontecido.
Um desses casos é o de uma mulher da cidade de Vila Maria, no norte do Estado, mãe de um menino de nove anos que sonha em ser ator. Em 2022, representantes da Elite teriam procurado os pais dele via redes sociais e informado que o filho teria sido "selecionado pra fazer um filme". A família trouxe o menino a Porto Alegre e fechou contrato para que ele desenvolvesse suas habilidades. Segundo a família, a criança só teve algumas aulas e não o restante acordado:
— Também nos frustramos. Gastamos mais de R$ 4 mil para realizar sonho dele, mas nunca mais foi chamado.
Outra mulher relatou que o filho teve apenas "algumas aulas teóricas e muito fracas" e a participação na peça e em filme, previstas em contrato, nunca aconteceram.
O advogado da escola afirmou que "em eventuais casos de contratação e não utilização do serviço, a escola sempre restituiu o aluno conforme contrato ajustado". No entanto, há relatos que mostram o contrário.
Uma mulher que enviou e-mail ao GDI diz que está processando a agência porque solicitou rescisão contratual antes do início do curso, se dispôs a pagar a multa rescisória, e na agência teriam dito a ela que no máximo 30 dias enviaram a rescisão e documento para pagamento, mas não teriam enviado.
— Suspendi o pagamento no banco com argumento de que teria pedido rescisão, mas o banco retornou a cobrança por que a produtora não confirmou a rescisão — relata.
O que diz a defesa
"Quanto às ações judiciais, a reportagem não mostrou quantas delas resultaram em pagamento de indenização por perdas, danos, ou condenação em qualquer outra tipificação legal que seja em nome da empresa, claramente por tratarem-se apenas de ações de cancelamento de contrato, as quais estão sendo todas defendidas. Em eventuais casos de contratação e não utilização do serviço, a escola sempre restituiu o aluno conforme contrato ajustado, sendo que em alguns casos houve acordo judicial com cumprimento integral do acordo. Em relação ao TAC, a empresa na época prestou todos os esclarecimentos e ajustou o termo de conduta com o MP, não havendo qualquer ilegalidade nisto, uma vez que o ajuste previa apenas uma correção texto no contrato de prestação de serviços.
Por isto, cabe reiterar que a Escola Elite não deixará de eximir-se de suas responsabilidades e apresentará defesa em todos os processos judiciais que tiver seu nome vinculado.
A Escola reitera que sempre cumpriu com suas obrigações, visto que sempre entregou um material gratificante aos alunos que por mais de 10 anos frequentaram a Escola, sendo que a mesma continuará disponível para prestar todo e qualquer esclarecimento legal a fim de findar esse irresponsável escárnio público que vem sendo perpetrado contra a Elite."
Entre em contato com o GDI
Tem uma história que devemos ouvir ou sabe sobre alguma irregularidade? Entre em contato pelo e-mail gdi@gruporbs.com.br ou pelo WhatsApp (51) 99914-8529.
O que é preciso enviar?
Por favor, seja o mais específico possível. O que aconteceu e por que você acha que devemos acompanhar essa história? Documentos, áudios, vídeos, imagens e outras evidências podem ser enviados. A sua identidade não será publicada nas reportagens.
Qual é o foco das reportagens do GDI?
O GDI se dedica principalmente, mas não apenas, a verificar uso de dinheiro público, veracidade de declarações de autoridades e investigações em geral.
* colaborou Fernanda Axelrud