A 2ª Vara Judicial de São Sepé, na Região Central do Rio Grande do Sul, condenou donos e gerentes de uma fábrica clandestina de cigarros paraguaios montada na região. Ela foi desativada pelas polícias Civil e Rodoviária Federal em março de 2020, após ser rastreada pelo Grupo de Investigação da RBS (GDI).
A empresa pirata funcionava em um antigo engenho de beneficiamento de arroz, às margens da BR-392, que liga São Sepé a Santa Maria. A existência da fábrica clandestina foi rastreada pelo GDI, que durante 45 dias conversou com contrabandistas e recebeu informações que possibilitaram a localização da indústria cigarreira. Ela fabricava cigarros 51, paraguaios e sem licença para serem industrializados ou vendidos no Brasil.
Em troca de informações com o GDI, os estrangeiros revelaram que chegavam vendados na fábrica – para não revelarem a localização – e tinham celulares confiscados. Viviam ali, dormindo em beliches ou colchões no chão, num galpão que também contava com cozinha.
A interceptação de diálogos telefônicos dos falsificadores (com autorização judicial) e o fechamento da indústria foram feitos pelo delegado Joel Wagner, da Delegacia de Polícia de Proteção ao Consumidor (Decon), da Polícia Civil. O promotor Alcindo Luz Bastos da Silva Filho, da área de Defesa do Consumidor, foi o responsável por denunciar os presos.
Foram presos em flagrante, na fábrica, 17 pessoas. Dessas, 11 eram paraguaios, trazidos do seu país para um trabalho com pouco descanso e do qual não tinham permissão para sair. Um dos gerentes do estabelecimento seria o paraguaio Bazílio Gonzalez Legal, que também recrutava seus compatriotas. Ele foi condenado a quatro anos, três meses e 10 dias de prisão. A juíza Bruna Casagrande Siebeneichler também condenou outros dois homens a penas idênticas. São eles Valdir Pedro de Lima, o Favela, pernambucano apontado como dono da fábrica, e Alex Sandro Rogério Souza, apontado como um dos outros gerentes da indústria clandestina e chefe de equipes que fabricavam o cigarro paraguaio. Os três foram sentenciados por integrar organização criminosa e fabricar e vender produto impróprio para consumo. Eles devem aguardar presos pelos recursos relativos à sentença.
Favela está recolhido num presídio na cidade de São Paulo. Bazílio, na Penitenciária Estadual de Santa Maria. E Alex Souza, também na mesma prisão santa-mariense.
Foram decisivos para a condenação diálogos entre Favela e os outros condenados, nos quais combina a embalagem dos cigarros falsos, os turnos em que cada operário deve trabalhar, as férias que querem tirar e as vendas do produto clandestino. São usadas gírias para definir os produtos ilegais: no lugar de caixas de cigarros, por exemplo, são mencionadas “peças”. Nos diálogos, eles conversam, entre outros assuntos, a respeito de caminhões apreendidos com contrabando de tabaco e como liberá-los. Pesou também o fato de dois dos três réus terem sido presos em flagrante, com máquinas ilegais, na indústria em São Sepé.
Em relação aos outros homens presos em flagrante na desativação da fábrica, o processo foi cindido e eles ainda não foram julgados. Eles sumiram, após serem libertados mediante habeas corpus. Os 10 paraguaios (exceto Bazílio) não foram localizados para depor no processo judicial.
Há indícios de que a fábrica clandestina implantada na mata em São Sepé produzia por dia, em média, 100 mil carteiras de cigarro. Em pelo menos duas conversas interceptadas pela Polícia Civil, o paraguaio Bazílio estima a produção do dia em 200 caixas — cada uma contém 50 pacotes, com 10 maços cada um, o que totaliza cerca de 100 mil carteiras. No varejo, esses 100 mil maços produzidos diariamente indústria pirata podem ser vendidos por R$ 300 mil (R$ 3 para cada maço). Mas os fabricantes não lucravam tanto: no máximo, R$ 1 por carteira, o que dá cerca de R$ 100 mil por dia.
CONTRAPONTOS
O que diz Bazílio González Legal:
O advogado dele, Roberto Corrrea La Regina, diz que vai impetrar recurso quanto ao tamanho da pena e para que o condeando seja libertado. Durante o interrogatório judicial, o paraguaio admitiu ser eletricista e mecânico da máquina clandestina de fabricar cigarros, mas negou ser líder da quadrilha. Ele disse que ajudou a montar a fábrica, porque já trabalhou no Paraguai, em indústria tabagista legalizada.
O que diz Valdir Pedro de Lima, o Favela:
o advogado dele, Guilherme Motta, diz que sentença do processo, ao analisar o mérito da questão , colocou Valdir Lima como um dos líderes da fábrica, razão pela qual será interposto recurso de apelação. Ao longo do processo judicial, Lima admitiu que fornecia e transportava produtos para embalar os cigarros, mas nega ser ligado ao crime organizado. Disse que é comerciante em São Paulo, dono de van e faz transportes. O serviço teria sido encomendado por um gaúcho de Santa Cruz do Sul, ligado ao setor fumageiro. Ele nega ter alertado os empregados da fábrica sobre a presença de policiais nas proximidades (como constam em diálogos telefônicos interceptados).
O que diz Alex Sandro Rogério Souza:
O advogado dele, Roberto Corrrea La Regina, diz que vai impetrar recurso quanto ao tamanho da pena e para que o condeando seja libertado. No processo judicial, Souza confirmou que sabia que a fábrica era clandestina e que trabalhou no local “por necessidade financeira”. Disse que ganhava cerca de R$ 3 mil mensais. Ele confirmou que recebia ordens de Valdir Lima, que por sua vez repassava ordens dos donos da fábrica, a quem ele não conhecia.