O clima de pavor que tomou conta dos moradores de Guaíba durante o rápido avanço das águas sobre o município da Região Metropolitana está sendo, gradualmente, substituído pelo sentimento de resiliência, em meio à limpeza de casas, veículos e pátios. Graças a uma soma de fatores, os guaibenses se viram cercados, no final de semana do dia 4 e 5 de maio, por águas que invadiram a cidade por três lados.
— A gente não acreditava que a água viria tão rápido. Quando vimos, o valão e os bueiros começaram a jogar água para fora. Eu não queria sair de casa — relata a professora aposentada Dalbori Pinto da Silva, uma das moradoras do bairro Cohab Santa Rita.
O bairro foi um dos mais atingidos pela enchente. Em 30 anos residindo na região, a professora aposentada nunca tinha testemunhado tal evento. Nesta segunda-feira (20), ruas e avenidas do bairro estavam tomados por móveis, louças, colchões, roupas e eletrodomésticos destruídos.
Moradores do Cohab Santa Rita relataram que a água avançou vindo do oeste, enquanto o Lago Guaíba está do lado oposto, no leste. Segundo a prefeitura, três fatores contribuíram para o cenário.
Em vídeo publicado nas redes sociais, técnicos da prefeitura afirmam que, além da cheia já esperada do lago Guaíba, o rio Jacuí (ao norte) transbordou e avançou 20 quilômetros, fazendo com que as suas águas alcançassem a cidade. Já bairros como o Loteamento Engenho sofreram, ainda, a influência de um extravasamento de uma barragem.
— Na Barragem Quexé, através de fotos, encontramos, um ponto de abertura com uma dimensão maior, que teria rompido e extravasando a maior parte de água — explica a arquiteta da prefeitura Tatiana do Santos Pereira.
A barragem localiza-se dentro dos limites de Eldorado do Sul. Segundo a prefeitura de Guaíba, a barragem possui 120 hectares e um quarto do seu conteúdo atingiu o Arroio do Conde.
O prefeito de Guaíba, Marcelo Maranata, nega irregularidades envolvendo obras públicas. Ele diz que os problemas observados na barragem foram comunicados às autoridades.
— Um levantamento já foi feito e enviado ao Ministério Público — garante o prefeito.
Segundo o chefe do executivo municipal, Guaíba levará pelo menos dois meses para concluir o recolhimento do lixo. O custo estimado da operação é de R$ 20 milhões. Uma parte do terreno que um dia foi destinado à fábrica da Ford foi licenciado emergencialmente para receber os detritos de forma provisória.
Um total de 10.543 imóveis foram atingidos nos bairros Cohab Santa Rita, Loteamento Engenho, Florida, Ipe e Alvorada, além de partes baixas do Centro. Nesta segunda-feira (20), Guaíba possuía 2063 pessoas em 58 abrigos, sendo que 975 são de moradores de Eldorado do Sul. No pico da crise, 57 mil pessoas ficaram desabrigadas.
Algumas optaram por permanecer às margens da BR-116. Em Eldorado do Sul, dezenas de pessoas preferiram permanecer próximos às suas casas, acampando de forma improvisada na rodovia. Uma faixa da BR-116 está interrompida no sentido interior-capital.
É o caso do motorista de caminhão Luís Amâncio, morador do bairro Picada, em Eldorado do Sul. Segundo ele, os vizinhos se ajudam, cuidando de veículos e animais que foram salvos e não teriam espaço em abrigos.
— Agora estamos preocupados com a leptospirose. A gente ainda tem contato com a água toda hora — apela.