Pessoa tranquila, amigo de todos, Waldir Conzatti, 74 anos, nunca quis briga com ninguém, nem mesmo aqueles atritos comuns entre irmãos. O agricultor aposentado, que residia no município de Roca Sales, no Vale do Taquari, perdeu a vida na enchente do início do mês, que resultou na morte de 48 pessoas, segundo dados registrados pela Defesa Civil do RS.
Filhos de Albino e Rosalina, já falecidos, os quatro irmãos — Waldir, Tânia, Walmir e Terezinha — nasceram e se criaram em Linha Bento Gonçalves, localidade no interior de Roca Sales. Uma infância típica de quem mora no campo — incluindo o cuidado de Waldir, o primogênito, com os irmãos mais novos. O Rio Taquari serviu de cenário para a infância dos irmãos. Zeca, como Waldir também era conhecido, repassava os conhecimentos que aprendera com seu pai.
– O Tio Waldir me ensinou muitas coisas sobre como trabalhar na lavoura, além de pescar e a nadar. O rio que ele tanto amava acabou o levando embora – conta Walmir, comerciante de 63 anos, um dos poucos que o chamava pelo nome de batismo.
Depois da infância, Zeca continuou morando no interior da cidade. Ele tinha como hobby receber os amigos e familiares em casa. A receita inusitada que gostava de oferecer era cabeça de porco assada, sempre ao lado da companheira Adiles, que preparava a sua galinha recheada. Com o tempo, os problemas na bacia o fizeram utilizar bengala para caminhar, mas os encontros, continuavam, ainda que com menos frequência.
O casal se divertia junto. Certa vez, este ano, sentado assistindo televisão, ele perguntou a Adiles como é que “aguentava tanto tempo” ao lado dela, faltando apenas um ano para completar 50 de casados, ao que esposa rebateu:
– E eu? Como eu aguentei? – respondeu, para risos mútuos.
Na noite de segunda-feira (4), data da enchente, Zeca estava na parte de cima de casa de uma tia quando a enxurrada o encontrou, com Adiles e outros primos.
— Eles subiram ao sótão quando viram que a água estava batendo no assoalho e ficaram sobre uma laje. Quando a casa girou, meu irmão falou para a esposa que iria morrer. Ele se foi e os outros ficaram ajoelhados por doze horas na chuva e no frio até chegar o resgate. Não sei se ele aguentaria — lembra Walmir.
A imagem de figura honesta e bondosa é a marca que Zeca deixará para as próximas gerações da família, segundo o irmão. Com a sua partida, a esposa confidenciou ao cunhado a vontade de não retornar à casa em que viveram por quase cinco décadas.
O filho mais velho de Albino e Rosalina foi sepultado no domingo (10), no Cemitério Católico de Roca Sales. Além da esposa, Zeca ou Tio Waldir deixa dois filhos, Rogério e Rangel.