Com animais vagando em algumas áreas que foram atingidas por incêndios de proporções gigantescas no último final de semana, em Alegrete, na Fronteira Oeste, o cheiro de matéria orgânica ainda permanecia no ar. E produtores rurais temem que as terras voltem a arder em chamas.
Levantamento preliminar do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) estima que pelo menos cerca de 7 mil hectares foram consumidos no município. O problema é visto como consequência da pior estiagem dos últimos 17 anos, já que as plantas rasteiras apresentam há meses a cor amarelada característica da carência de água. Os relatos são de mais de dois meses sem chuvas fortes na região. No entanto, alguns focos de fogo serão investigados.
O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) fez um levantamento das áreas afetadas pelo fogo na Área de Proteção Ambiental (APA) do Ibirapuitã, com auxílio de imagens de satélite. Somente na APA, localizada em parte do município de Alegrete, foram queimados 4.580 hectares. Os dados serão enviados para investigação do Ministério Público e da Polícia Federal. A APA do Ibirapuitã está distribuída também em Quaraí, Rosário do Sul e Santana do Livramento, sendo que cerca de 90% das áreas preservadas estão em propriedades particulares.
— É a única unidade de preservação federal do Bioma Pampa, sendo a mais representativa, com 317 mil hectares e enorme diversidade de animais. Com os incêndios, o solo fica exposto à erosão, há lixiviação das cinzas, assim como poluição da água e do ar, afetando toda a cadeia alimentar — destaca o analista ambiental, Raul Paixão Coelho, chefe da APA pelo ICMBio.
Do lado de dentro da porteira, os produtores rurais tiveram danos significativos. Além do pasto perdido, animais morreram e máquinas agrícolas foram destruídas. Na Estância Sá Brito, uma das maiores da localidade de Pai Passo, cerca de 750 hectares de campo nativo foram destruídos no último domingo. Os animais foram salvos, mas os prejuízos contabilizam 10 mil metros de cercas queimadas, além dos campos que viram cinzas, conforme um dos proprietários, André Gomes.
Na Estância do Retiro, cerca de 30 quilômetros do centro de Alegrete, o incêndio do fim de semana chegou muito perto das duas residências da fazenda. Pelo menos um carneiro morreu ao se enroscar em galhos de árvore e não conseguir sair do local. O corpo dele ainda jazia na tarde passada.
Cláudia Mason Campos, proprietária das terras, disse que contou somente com auxílio dos funcionários e vizinhos para tentar combater o fogo e salvar os animais. Segundo ela, não houve apoio das autoridades:
— Os prejuízos que sofri são incalculáveis, mas agradeço por não termos tido perdas humanas. Fica o meu registro de inconformidade com a negligência das autoridades municipais, estaduais e federais.
No Centro Administrativo de Alegrete, foi debatido um plano municipal de combate às queimadas, por meio de um comitê local, envolvendo órgãos municipais, estaduais e entidades do setor rural. Entre as ações a serem implementadas, está a formação de brigadistas no combate a incêndios.
O Comando Regional do Corpo de Bombeiros informou que nos primeiros 17 dias deste ano foram registrados 265 focos diante de 25 casos no mesmo período de 2021, o que resulta em aumento de 960%. O comandante do 10º Batalhão de Bombeiros Militar, Rafael Gonçalves Pereira, reconhece que há dificuldades em conter as chamas:
— Um evento que fugiu totalmente da nossa realidade, tínhamos um plano de enfrentamento a incêndios em vegetação, mas, a atual estiagem superou muito nossas expectativas, fato em que necessitou que o comando geral da corporação nos enviasse considerável número de efetivo de fora em apoio.