Após uma vistoria, o Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers) notificou o Hospital Nossa Senhora das Graças, de Canoas, pela falta de condições para o trabalho médico e também pela precariedade no atendimento à população. A visita ao hospital, que sofre com problemas financeiros e estruturais há alguns anos, foi realizada na sexta-feira (8).
De acordo com o vice-presidente do Cremers, Eduardo Neubarth Trindade, a entidade foi contatada por médicos para averiguar a situação no local, que estaria insustentável. A principal reclamação, segundo Trindade, dizia respeito ao acúmulo de tarefas e ao número escasso de profissionais da saúde para prestar atendimento.
— Em ambientes que precisariam de dois a três colegas atendendo, havia apenas um. Um médico atendendo pacientes covid, não covid, que demandavam cuidados intensivos, tinha que prestar informações aos familiares, enfim, por isso a gravidade. Falta de estrutura e condições materiais sabemos que há em muitos lugares, mas essa demanda de trabalho nos chamou atenção — explicou o vice-presidente.
O prazo para a diretoria do hospital prestar esclarecimentos ao conselho é até a próxima terça (12) — a nova gestão, comandada pelo presidente da Associação Beneficente Canoas, Luis Antonio Possebon, assumiu na última segunda (4) após nomeação do prefeito. A partir daí, dependendo do plano de ação apresentado, novas medidas podem ser tomadas pelo Cremers, como a notificação da Secretaria da Saúde do município e até do Ministério Público Estadual.
— É uma situação que precisa ser sanada imediatamente, a falta de recursos humanos para atendimento na emergência. Queremos encontrar soluções, mais do que tomar medidas drásticas. Fechar um hospital deixa a população sem atendimento — avalia Trindade.
Atraso de salários e intervenção
O diretor Possebon defende que está à frente de uma instituição "degradada" e "praticamente abandonada". Reconhece que há falta de médicos, atraso de salários e sobrecarga de trabalho — o que torna ainda mais difícil garantir profissionais na linha de frente. O ajuste das contas do hospital está no topo da lista de prioridades justamente para resolver os impasses na remuneração dos funcionários e na compra de medicamentos, ele explica:
— Há médicos sem receber há meses e não posso correr o risco de alguém morrer por falta de anestesista, por exemplo. Peço 30 dias para nos organizarmos, vou ter que reduzir custos. Eu dependo de dinheiro e da onde vou tirar? Estamos tomando providências.
Nos próximos dias, Possebon deve iniciar tratativas com o Banrisul para garantir empréstimos que ajudarão a suprir o rombo financeiro — o acumulado é de mais de R$ 115 milhões em dívidas. O diretor também está buscando apoio do empresariado para estabilizar as contas do hospital.
O Nossa Senhora das Graças está sob intervenção da prefeitura desde o mês de novembro, quando era gerido pela Associação Beneficente São Miguel. A Secretaria Municipal da Saúde decidiu assumir o controle para manter o atendimento à população após ser comunicada sobre o risco de fechamento da emergência e do agravamento da crise financeira.
Na última quinta (7), o executivo municipal disponibilizou R$ 4,7 milhões para o pagamento dos salários de dezembro e da segunda parcela do 13º dos funcionários da instituição. O hospital é referência do SUS, com 80% do atendimento voltado à saúde pública.
Leia abaixo a notificação do Cremers:
Comunicação aos médicos e à população
Preocupado com a gravidade da situação do trabalho médico e com a precariedade do atendimento à população nas Unidades de Cuidados Especiais e UTI Covid do Hospital Nossa Senhora das Graças, de Canoas, o Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul (Cremers), após Ato Fiscalizatório realizado nesta sexta-feira (8), entrega Termo de Notificação ao diretor técnico da instituição para que providências sejam tomadas o mais breve possível.