O Exército investiga em São Luiz Gonzaga uma suspeita de assédio e abuso sexual contra um soldado por parte de um colega, lotado na mesma unidade, o 4º Regimento de Cavalaria Blindado (4º RCB). O autor da denúncia está sob tratamento psicológico, e o caso é apurado em processo administrativo. O Exército diz que a denúncia demorou nove meses para ser feita pela suposta vítima.
Os fatos teriam ocorrido no 4º RCB, onde o soldado, hoje com 20 anos, ingressou em março do ano passado para cumprir serviço militar obrigatório (que pode durar de nove a 18 meses). Em relato feito à reportagem, o militar contou que trabalhava no refeitório do quartel e que um colega mais antigo se esfregou nele com o pênis ereto. Ele disse ter relatado o fato a superiores, mas que nada foi feito à época. Teriam apenas pedido que o suposto autor do ato pedisse desculpas. Segundo o denunciante, em razão do fato e de pressões por ter feito a queixa, ele passou a sofrer problemas psicológicos, tendo agora sido diagnosticado com estresse pós-traumático.
O caso começou a ser apurado pelo Exército em maio, quando, segundo a instituição, só então o militar teria feito a denúncia do fato ocorrido nove meses antes. A advogada do soldado, que pediu que seus nomes não fossem expostos, afirma que entrou com ação contra a União para impedir que o cliente fosse dispensado, já que se aproximava data do final da prestação de serviço militar obrigatório:
— Queriam mandar ele embora mesmo doente. Nós queríamos garantir ele assalariado e em tratamento médico — explica ela.
Na ação, foi pedida a manutenção do cargo público militar por tempo igual ou superior ao do tratamento médico, pagamento de lucros cessantes (devido a perdas salariais que ele estariam tendo) e indenização por danos morais com tutela antecipada de urgência, ou seja, que os pedidos fossem acatados antes de uma análise de mérito. Com a defesa do Exército, a Justiça entendeu não haver motivos para o pedido, que foi indeferido.
O Exército sustentou que os fatos teriam ocorrido nove meses antes e que até maio não teriam sido levados ao conhecimento de nenhum superior para apuração. A instituição também demonstrou à Justiça que o soldado estava recebendo tratamento médico e que, apesar de afastado das atividades, seguia recebendo salário.
Exército afirma que soldado recebeu tratamento psiquiátrico
Segundo relato do Exército à Justiça Federal, a partir da denúncia, o soldado foi colocado em tratamento psiquiátrico e chegou a ganhar duas licenças médicas de 30 dias cada. Em agosto, quando deveria ser licenciado do serviço militar (devido ao fim do serviço temporário), não o foi porque precisava passar por nova avaliação médica. Submetido à inspeção de saúde em setembro, foi verificado que ele seguia com incapacidade temporária para exercer funções. O soldado foi mantido afastado do serviço, como adido administrativo, e segue em tratamento e recebendo salário como soldado.
Em razão disso, a Justiça Federal indeferiu o pedido de tutela antecipada de urgência e deu ao autor prazo para se manifestar novamente. "Por tal motivo, entendo necessária a intimação do autor para que, a par destas considerações, preste os devidos esclarecimentos acerca do pedido e sua consequente causa de pedir", escreveu a juíza na decisão.
Conforme a advogada do militar, não é verdade que ele não tenha comunicado o fato antes:
— Ele informou sim, assim que aconteceu, mas foi abafado. E ele foi piorando. Ele está com doença psiquiátrica grave. Ele entrou sadio no Exército e acabou acometido de várias enfermidades. E ainda sofre violência psicológica até hoje. Cada vez que vai ao quartel sofre bullying. A última agora é que foi de roupa civil para uma consulta e está ameaçado de sofrer sindicância e punição. Só queremos garantir que ele tenha atendimento de saúde digno. E se essa enfermidade for permanente, ele tem de ser reformado. Não pode ser mandado embora.
Segundo a advogada, o soldado será internado nos próximos dias para um tratamento mais forte.
— Foi ferido o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Ele sofreu perseguição e tratamento discriminatório por ter denunciado o abuso sofrido. Era um jovem saudável e agora está doente — diz ela.
Contraponto
O que diz a Seção de Comunicação Social do Comando Militar do Sul:
"Conforme consta no processo, o qual está judicializado e conduzido na 1ª Vara Federal de Santo Ângelo, o militar encontra-se adido administrativamente ao 4º Regimento de Cavalaria Blindado, realizando tratamento de saúde e percebendo normalmente remuneração referente à sua graduação. Demais informações podem ser encontradas nos documentos constantes do processo, haja vista que o mesmo não está sujeito ao segredo de justiça. Informamos que o 4º Regimento de Cavalaria Blindado instaurou um processo administrativo para a apuração dos fatos alegados".
Sobre outras afirmações feitas pela advogada, a comunicação disse aguardar "as apurações no curso do processo em andamento".