O Ministério Público Federal (MPF) pediu esclarecimentos à Escola de Aperfeiçoamento de Sargento das Armas (Easa), em Cruz Alta, no noroeste do Estado, sobre a previsão de início de curso presencial em setembro. O calendário da Easa prevê o começo da segunda fase do Curso de Aperfeiçoamento de Sargentos das Armas (CAS) para o dia 8 de setembro.
A unidade militar estima receber cerca de 360 militares de diversas regiões do país para a formação — 57 são do Rio Grande do Sul. Segundo a Easa, esse número pode diminuir no início do curso. A previsão é de que essa etapa dure 10 semanas.
Na solicitação preliminar de informação, a Procuradoria da República no Rio Grande do Sul deu cinco dias para a Easa explicar a realização do curso e se a atividade não viola o decreto estadual 55.241, que manteve a suspensão de atividades educacionais presenciais durante a pandemia. A procuradoria também questionou a urgência da realização do curso em um momento onde a pandemia avança e a maioria das atividades educacionais estão suspensas.
Após essas informações serem reunidas, o procedimento pode se transformar em inquérito civil ou resultar na propositura de uma ação se “os fatos e autores fiquem bem definidos durante seu trâmite”. Caso contrário, a peça é arquivada, segundo o MPF.
Ao justificar a importância da realização dessa etapa presencial do curso, o comandante da Easa, coronel Richard Alves Fioravante, afirma que o cancelamento teria impacto no fluxo de carreira dos militares. A não realização também privaria organizações militares de receber profissionais com maior qualificação, causando prejuízo imediato no combate à pandemia, pois os militares aperfeiçoados são preparados para operações em que o Exército é empregado, como a que combate a crise sanitária da covid-19, segundo o coronel.
Seguindo na mesma linha do comandante da Easa, outra fonte do alto escalão das Forças Armadas ouvida pela reportagem de GaúchaZH destaca que há necessidade de aperfeiçoamento do pessoal das Forças Armadas, assim como acontece nas polícias. Essa fonte também afirma que é impossível fazer todo o treinamento via ensino a distância (EAD).
Fioravante afirma que os militares que virão para fase presencial do curso passarão por testagem em massa para “possibilitar a identificação precoce de casos positivos assintomáticos”. Segundo o coronel, desde o começo da pandemia, postos de triagem e higienização operam para avaliar todas as pessoas que entram na escola e o uso de máscaras de proteção obrigatório em todas as atividades dentro e fora da unidade. Entre as medidas de segurança específicas que serão tomadas, Fioravante destaca protocolo de isolamento para casos suspeitos e para possíveis casos confirmados durante o curso.
“Os militares com testagem positiva serão imediatamente isolados em local previamente destinado para receberem o tratamento adequado e somente serão liberados do isolamento após a fase de transmissão e confirmação da cura”, informou em comunicado.
A Easa também estabeleceu distanciamento em atividades dos militares em sala de aula, nas refeições e alojamentos. O local também conta com equipe de saúde disponível 24 horas para o atendimento aos alunos e demais militares da escola, segundo o comandante.
Originalmente, a formação, que ocorre anualmente, tem duração de 41 semanas, sendo 30 por meio de EAD e 11 no modo presencial. A pandemia acabou provocando ajustes no calendário do curso neste ano, como a diminuição de uma semana na duração da fase presencial e o adiamento do início dessa etapa em uma das turmas, no meio do ano. Até o momento, a Easa registrou apenas um caso de covid-19. O militar infectado é um soldado, que está recuperado da doença.
A prefeitura de Cruz Alta informou que encaminhou ofício à Easa, com questionamentos sobre a realização do curso. Em resposta, a unidade militar elencou as medidas de seguranças que serão adotadas durante a formação, segundo o Executivo municipal. Agora, a prefeitura analisa as respostas e segue conversando com a escola para alinhar medidas de segurança.
Segundo a Easa, normalmente, os alunos alugam imóveis para moradia no município durante o curso. A escola oferece alojamento no formato de apartamentos. Esses ambientes foram preparados para manter o "distanciamento preconizado nas orientações técnicas expedidas pelo Comando do Exército Brasileiro", conforme o órgão.
Bolha seria a melhor saída, segundo infectologista
O infectologista do Hospital de Clínicas e professor de Infectologia da UFRGS Luciano Goldani afirma que o cenário atual da pandemia no Estado não cria condições para desenvolver atividades de ensino presenciais com segurança:
— Acho muito difícil qualquer atividade presencial, pela circulação que o vírus está tendo agora no Estado, ainda mais colocando pessoas que vem de fora. Teria de fazer uma coisa muito benfeita no ponto de vista de manter as pessoas afastadas.
Goldani destaca que a melhor alternativa seria tentar readequar as atividades para o EAD. Em um cenário onde essa opção não está na mesa, o infectologista afirma que a melhor alternativa seria a criação de uma “bolha”. Nessa hipótese, os alunos seriam testados antes de entrar em um ambiente controlado, que não teria contato com agentes externos. No entanto, Goldani destaca que essa opção acaba se inviabilizando por ser muito cara para manter.