Barão de Cotegipe: dificuldade para engordar o gado
Se nas lavouras o impacto da estiagem é medido em toneladas de grãos que deixam de ser colhidas, na pecuária o prejuízo se reflete no aumento das dificuldades para alimentar o rebanho. Desde que o tempo seco começou a atingir o Rio Grande do Sul, o pecuarista Marcos Czapla notou que aumentou o tempo de engorda das 180 cabeças de gado de corte em sua propriedade em Barão de Cotegipe, município de 6,5 mil habitantes no Norte.
O ciclo de ganho de peso está defasado entre 30 e 40 dias, segundo o criador, o que acaba retardando a venda dos animais para abate. A mudança abrupta no ritmo da engorda não ocorre por acaso. O milho cultivado para a silagem teve queda de qualidade e quebra na safra, com a produtividade média caindo de 200 para 80 sacas por hectare. Além disso, o tempo comprometeu as pastagens e as três nascentes localizadas perto da propriedade estão com o volume hídrico escasso.
- O custo para manter os animais fica mais alto e o ganho se reduz na ponta final. Aquela esperança que se tinha em ganhar (com o aquecimento recente do mercado do boi gordo) é frustrada - diz Czapla.
O desabastecimento é evitado porque parte da demanda hídrica é atendida em um açude próximo da propriedade e por causa de um caminhão-pipa que percorre a zona rural. O veículo é utilizado também para abastecer as residências na área urbana de Barão de Cotegipe e, neste momento, é o que garante água para consumo humano e dos animais.
Miraguaí: tristeza atinge os animais
Em uma cidade com mais vacas do que pessoas, a estiagem deixou os animais abatidos e trouxe aflição aos criadores. Localizada no noroeste do Estado, Miraguaí tem na produção de leite uma de suas principais atividades econômicas. O rebanho de gado leiteiro no local alcança 5,8 mil cabeças, enquanto a população não passa dos 4,9 mil habitantes, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A combinação entre alimentação com silagem de baixa qualidade e pouca disponibilidade de água, decorrente do tempo seco, aumentou a incidência de tristeza parasitária bovina nos rebanhos, doença também conhecida como amarelão.
- O gado começa a ficar triste pelo clima. O bicho também fica estressado. É algo parecido como uma depressão para os humanos - relata o pecuarista Evaldo Kirchoff.
O calor intenso afetou o pasto e derrubou a produção de milho para a silagem dos rebanhos em Miraguaí. Além disso, a cidade enfrenta dificuldades de abastecimento de água. Um caminhão-pipa é utilizado pela Corsan para manter o fornecimento para consumo humano e para as atividades rurais.
A tristeza dos animais diminuiu a produtividade no rebanho de Kirchoff, com 50 vacas. Antes da estiagem, cada animal produzia em média 30 litros de leite por dia. Agora, o rendimento não passa dos 20 litros diários. Ao mesmo tempo em que a renda caiu, em decorrência da queda no volume captado, aumentaram os gastos com medicamentos para o tratamento do amarelão nos animais. Para dar conta das despesas, o criador teve de usar recursos de uma poupança que mantinha para situações de emergência.
Uruguaiana: navegação no Rio Uruguai ficou inviável
O caráter prolongado é uma das marcas da estiagem deste ano em relação às anteriores. Enquanto em 2020, a irregularidade da chuva ocorreu nos quatro primeiros meses, em episódios passados os danos eram concentrados em um período menor, geralmente entre janeiro e fevereiro. Isso fez com que os cursos d'água do Rio Grande do Sul agonizassem por mais tempo e, em diversos momentos, atingissem níveis extremamente baixos.
O Uruguai, um dos principais rios que passam pelo Rio Grande do Sul, atingiu o menor nível da história em abril. Em diversos pontos ficou abaixo de um metro de profundidade, quando deveria estar acima de quatro metros. Essa situação chegou a inviabilizar, durante semanas, a navegação em Uruguaiana, cidade de 125 mil habitantes, na Fronteira Oeste.
O pescador José Souto recorda que houve um período de aproximadamente 20 dias, em março, que não conseguia chegar nos pontos onde costumava pescar devido ao nível reduzido da água.
- Era só sujeira no rio, foi o momento em que chegou ao nível mais crítico. Estava com menos de 50 centímetros. Não conseguíamos pescar, nem navegar - aponta.
Vivendo da pesca há duas décadas, Souto viu sua renda despencar. Ele costumava obter entre cem e 150 quilos de peixes por semana, mas a média caiu para 15 a 20 quilos semanais nos períodos mais críticos do Uruguai.
Os problemas para pagar as despesas de casa se intensificaram após a chegada da pandemia de coronavírus, já que os intermediários que adquiriam os pescados reduziram as compras. Em meio às dificuldades, o pescador se cadastrou em abril para receber o auxílio emergencial do governo federal. No entanto, até o momento, o pedido segue em análise.