Com dificuldades na compra de insumos necessários para o combate à covid-19, o governo da Bahia fechou recentemente uma aquisição de 60 mil kits de testagem. A falta de material para testes é hoje o maior gargalo para que o Brasil conheça a real dimensão do coronavírus no país. O problema, no entanto, tem afetado o mundo todo.
O Ministério da Saúde informou a compra de 22,9 milhões, mas até o momento apenas 900 mil foram distribuídos.
Na última terça-feira (14), o Instituto Butantan recebeu 725 mil kits para testes RT-PCR de uma compra feita pelo governador João Doria (PSDB). Com isso, passa a ter insumos para a realização de 867 mil exames.
Os testes adquiridos pelo governo baiano, produzidos em uma fábrica chinesa, são do tipo RT-PCR . A expectativa da empresa que importou os kits é adquirir até 3 milhões de testes para distribuição no Brasil.
Também chamados de moleculares, esses testes buscam a presença do vírus no organismo através da análise de material coletado da garganta e nariz.
A fabricante chinesa Hybribio produz testes usando dois marcadores para detectar o coronavírus. O gene "Orf1 a" e o gene "N", que correspondem respectivamente a um fragmento aberto do genoma e à proteína nucleocapsídeo. Os dois genes atuam na formação da cápsula protetora do vírus.
De acordo com pesquisa feita na China e publicada na forma de "preprint" no repositório bioRxiv, ainda sem revisão por pares, na comparação com outros três kits para detecção do Sars-CoV-2, o uso desses marcadores atingiu 100% de especificidade e obteve êxito em todos os testes feitos com amostras positivas e negativas.
O teste tem certificação sanitária da China e da União Europeia e possibilitou diagnósticos mais rápidos em ao menos trinta países.
No início de abril, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou seu uso no Brasil, e o governo da Bahia já recebeu a primeira parcela de 5.000 kits, com a previsão da chegada de mais 55 mil.
De acordo com o governo baiano, a entrega dos lotes será feita semanalmente até maio. Os testes vão ser distribuídos entre as unidades Salvador, Porto Seguro, Guanambi, Juazeiro e Vitória da Conquista do Laboratório Central de Saúde Pública (Lacen) da Bahia.
A empresa B3B A Vida, responsável pela distribuição no país, afirma que os testes realizados até o momento no Lacen também foram bem sucedidos: em 94 amostras realizadas, o índice de acerto foi de 100% em 90.
O primeiro lote da compra desembarcou no país no último dia 10 via Estados Unidos.
A empresa informa que, devido ao volume esperado das próximas remessas, a expectativa é escolher uma rota que não ofereça riscos de interdição da carga. Com o preço individual inicial de R$ 200, a importadora pretende se consolidar no mercado de insumos médicos nacional.
— O país já possui a tecnologia de PCR para outros diagnósticos e acreditamos que a implementação será bem fácil, pois os equipamentos necessários já existem aqui — diz Bruno Albuquerque, diretor de relações institucionais da B3B A Vida.
Renata Cássia Pires, professora associada do Departamento de Análises Clínicas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e pesquisadora da Fiocruz, afirma que uma das vantagens desse teste é a rapidez com que os resultados serão produzidos.
— O tempo médio de realização do exame laboratorial tem sido de menos de duas horas. Isso porque o kit já faz a amplificação [do material genético] e o diagnóstico ao mesmo tempo. Como são dois marcadores utilizados, a sensibilidade e especificidade são elevadas, o que dá maior precisão nos resultados — completa.
O princípio dos testes moleculares é uma reação em cadeia, que dá nome ao procedimento, da enzima polimerase, responsável por "criar" fragmentos de DNA. O material genético do vírus, que é uma fita simples de RNA, é primeiro transformado em uma dupla fita, o DNA, para fazer a amplificação.
Com o kit chinês, o primeiro processo pode acontecer no mesmo ciclo, não sendo necessário realizar essa transformação do material genético do vírus antes, o que reduz a duração do procedimento.
Pires afirma ainda que, por se tratar de um procedimento já amplamente utilizado em muitos laboratórios no Brasil, a utilização do kit de RT-PCR será mais simples, não sendo necessária tecnologia inovadora.
A demora na liberação dos exames de RT-PCR no estado de São Paulo é dada principalmente pela falta de insumos usados no procedimento adotado pelo Instituto Adolfo Lutz (IAL), que é o mesmo preconizado pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
A Plataforma para Diagnósticos de Coronavírus, coordenada pelo Instituto Butantan, aguarda o credenciamento ainda de 11 dos 45 laboratórios integrantes, o que depende da implementação do protocolo utilizado pelo IAL.