O desfecho do processo que apura injúria racial por meio do envio de mensagens de telefone e envolve o estudante de Direito da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Elisandro Ferreira, 44 anos, ficará para 2020. A primeira audiência do caso ocorreu na última terça-feira (3), em Santa Maria, mas em função dos prazos para acusação e defesa apresentarem suas alegações finais e, posteriormente, do recesso do Judiciário, não deve haver tempo hábil para que a sentença saia neste ano. Ferreira é apontado pelo Ministério Público Federal (MPF) como autor do envio de mensagens por SMS para o próprio telefone e também para o de uma colega.
Ele mesmo comunicou o recebimento de textos à Polícia Federal (PF), ainda em 2017, afirmando ser vítima do crime. Mas, com a quebra de seu sigilo telefônico, a PF concluiu que, de vítima, Ferreira, passou a ser autor do crime que relatou. Ele foi denunciado por injúria racial, denunciação caluniosa, ameaça e falsidade ideológica pelo Ministério Público Federal no dia 7 de maio de 2019. Em junho deste ano, a Justiça aceitou a denúncia do MPF, e Ferreira virou réu no caso. O processo é acompanhado pela Justiça Federal por envolver uma instituição da União.
Conforme a procuradora da República, titular do 2º ofício no Ministério Público Federal (MPF), Tatiana Dornelles, na audiência que ocorreu na sede da 2ª Vara Federal e durou mais de quatro horas, foram ouvidas quatro testemunhas de acusação e três de defesa. O réu também prestou depoimento.
De acordo com o advogado do réu, Patrick de Oliveira Teixeira, uma das testemunhas de defesa trouxe novos argumentos que, segundo ele, comprovam que Ferreira não cometeu os crimes pelos quais está sendo acusado. O advogado não dá detalhes desse depoimento para preservar a testemunha, mas ele destaca que os argumentos trazidos por ela explicaram questões sobre o aparelho celular de onde foram enviadas as mensagens:
— A testemunha que foi trazida a juízo pela defesa traz elementos suficientes para esclarecer a situação do telefone usado para envio das mensagens, bem como em que circunstância esse aparelho foi usado e porque foi imputado ao Elisandro essa culpa que a defesa reitera que não é dele. Essa testemunha procurou por duas vezes a Polícia Federal e só não foi ouvida porque o inquérito já tinha sido encerrado. Procurou o Elisandro posteriormente para dizer que tinha informações importantes acerca do fato. Então, a defesa saiu da audiência convicta dos argumentos que sustenta desde o início de que Elisandro é vítima das mensagens contendo injúria racial.
Conforme consta no inquérito, o réu comprou um chip de celular, cadastrou no nome e no CPF de um colega que ele denominou como suspeito e, do próprio aparelho celular, enviou as mensagens para si mesmo e para a então colega. Na denúncia, o MPF cita ainda que outros elementos contribuem para a indicação de autoria dos crimes a Elisandro. É citado, por exemplo, que a antena que conecta o telefone para que ele funcione foi a mesma para o envio das mensagens e para o uso do aparelho de Elisandro. Já a do colega, então indicado como suspeito por Elisandro, era outra, que fica no bairro Camobi.
Segundo a procuradora, mesmo com novos argumentos e justificativas apresentadas pela defesa do réu durante a audiência, o MPF segue com o entendimento de que Ferreira é o autor dos crimes de que diz ter sido vítima:
— As testemunhas de acusação confirmaram o que já estava na denúncia. Foram ouvidas as duas vítimas (a que recebeu as mensagens e a pessoa que o Elisandro indicou como autor do envio), o delegado e um servidor da Polícia Federal que conduziram as investigações e confirmaram novamente o que já tínhamos de subsídio do inquérito. Esperamos que seja atendido nosso pedido de condenação nos termos da denúncia. O que foi argumentado na audiência não modificou a opinião jurídica do Ministério Público.
Como há prazos processuais a serem cumpridos, inclusive para as alegações finais, ainda conforme a procuradora da República, a sentença só deve ocorrer após o recesso do Judiciário — que inicia em 20 de dezembro e termina um mês depois:
— Estamos na fase das alegações finais quando tanto acusação quanto a defesa passam para o juiz quais são as suas impressões até agora, o que foi colhido durante a instrução processual, e reafirmam o que entendem sobre o processo. Como tem esses prazos em andamento, neste ano é impossível que se tenha a sentença.
O caso do envio das mensagens de telefone veio à tona depois que Ferreira e uma colega tiveram os nomes escritos em paredes do Diretório Acadêmico do Direito junto a mensagens racistas, em setembro de 2017. A investigação deste fato foi encerrada na esfera policial, em setembro deste ano, sem indicação de autoria. O inquérito foi encaminhado para manifestação do MPF que arquivou o processo por falta de provas.