A 2ª Vara da Justiça Federal de Santa Maria aceitou a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal (MPF) em investigação sobre injúria racial por meio do envio de mensagens de telefone. O caso envolve o estudante da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Elisandro Ferreira, 44 anos, apontado pelo MPF como autor do envio de mensagens para o seu próprio telefone e também para o de uma colega. Ele mesmo comunicou o fato à Polícia Federal (PF), ainda em 2017, afirmando ser vítima do crime.
No despacho, assinado em 28 de maio, o juiz Daniel Antoniazzi aceitou a denúncia contra o estudante e deu prazo de 10 dias, a contar do recebimento da intimação – que ainda não ocorreu – para que a defesa apresente sua alegação. Caso isso não ocorra no prazo determinado, o juiz determinou que a Defensoria Pública se encarregue da defesa.
Elisandro foi denunciado pelos crimes de injúria racial, denunciação caluniosa, ameaça e falsidade ideológica pelo Ministério Público Federal no dia 7 de maio.
— O juiz considerou que na denúncia eu apresento provas da materialidade do crime e ainda indícios suficientes de que quem praticou os crimes que eu relato foi o denunciado, no caso, o Elisandro — disse a procuradora da República que assinou a denúncia, Camila Bortolotti.
Antes do desdobramento desse caso, um caso de racismo dentro da UFSM envolveu o estudante em setembro de 2017. Ele e uma colega tiveram os nomes escritos nas paredes de uma sala da instituição junto a mensagens racistas e de ódio. A investigação deste fato ainda não foi concluída e o autor das escritas ainda não foi identificado. O caso pelo qual Elisandro virou réu ocorreu três meses depois das mensagens racistas terem sido escritas dentro da instituição.
GaúchaZH entrou em contato, no início da tarde desta quinta-feira (6), com o advogado de Ferreira, Patrick de Oliveira Teixeira, que informou não ter sido intimado ainda sobre o recebimento da denúncia pela Justiça. Mesmo assim, destacou que a defesa manterá a posição de que Elisandro não cometeu os crimes pelos quais está sendo acusado:
— Vou reiterar o que viemos dizendo desde o início. Até o presente momento, não há, nos autos do processo, provas suficientes para comprovar os termos da denúncia nem para condenar o Elisandro. Nossa tese de defesa será de negativa de autoria, não foi ele quem fez isso. Eu vou defendê-lo para comprovar que o telefone que mandou as mensagens e o chip que constava nele não é de propriedade do Elisandro e não sendo de propriedade dele não tem como condená-lo.
Histórico dos casos
Nos anos de 2017 e 2018, a UFSM foi alvo de uma série de ataques racistas e de ódio. Em um dos casos, em setembro de 2017, Elisandro Ferreira e Fernanda Rodrigues, ambos acadêmicos do curso de Direito à época, foram alvo de pichações racistas em paredes de uma sala do Diretório Acadêmico do Direito da instituição. Foram escritas as frases "O lugar de vocês é no tronco" e "Fora negros" junto ao nome deles.
Até hoje, o autor dessas pichações não foi identificado, e a investigação segue em aberto na Polícia Federal. Contudo, uma reviravolta colocou Elisandro como suposto autor de outro crime de origem semelhante: o envio de mensagens ameaçadoras e de injúria racial por SMS no celular. Em 7 de maio deste ano, o MPF denunciou Ferreira pelos crimes de injúria racial, denunciação caluniosa, ameaça e falsidade ideológica. Elisandro, conforme a UFSM, é aluno regular da instituição atualmente.
De acordo com a procuradora da República que ofereceu a denúncia, Camila Bortolotti, três meses depois de ter o nome escrito nas paredes do Diretório Acadêmico do Direito, Ferreira foi até a Polícia Federal comunicar que estava sendo vítima de mensagens ameaçadoras, por telefone, contendo injúria racial. Afirmou que a colega também teria recebido as mesmas mensagens.
A PF passou a averiguar a situação e foi realizada a quebra do sigilo telefônico. Com isso, a PF conseguiu concluir que, de vítima, Elisandro, passou a ser autor do crime que relatou. Conforme consta no inquérito, concluído e enviado ao MPF em dezembro do ano passado, ele comprou um chip de celular, cadastrou no nome e no CPF do colega que ele denominou como culpado e, do próprio aparelho celular, enviou as mensagens para si mesmo e para a então colega.
A estudante também já tinha comparecido à delegacia para relatar o recebimento das mensagens que, conforme ela, vinham do mesmo número de telefone que tinha sido citado por Elisandro, mas ela não indicou um suspeito para o fato. As condenações pelos crimes denunciados pelo MPF, juntas, podem somar oito anos de reclusão e pagamento de multa.
Na denúncia, constam ainda outros elementos, que conforme a procuradora da República, contribuem para a indicação de autoria dos crimes a Elisandro. Ela cita, por exemplo, que a antena que conecta o telefone para que ele funcione foi a mesma para o envio das mensagens racistas e para o uso do aparelho de Elisandro. Já a do colega, então indicado como suspeito por Elisandro, era outra, que fica no bairro Camobi.