RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Desde o incêndio que atingiu suas instalações em setembro do ano passado, o Museu Nacional, no Rio de Janeiro, recebeu cerca de R$ 1,1 milhão em doações. A título de comparação, foram recolhidos mais de R$ 3 bilhões em dois dias para a reconstrução da Catedral Notre-Dame, na França, que pegou fogo na segunda-feira (15).
A Associação Amigos do Museu recebeu R$ 142 mil de pessoas físicas e R$ 15 mil de pessoas jurídicas. O governo alemão doou cerca de R$ 800 mil, podendo repassar até R$ 4,4 milhões, a depender da necessidade do museu. Já o British Council doou R$ 150 mil.
Após o incêndio na catedral, uma pessoa física doou mais R$ 20 mil para a instituição, gesto comemorado pelo diretor, Alexander Kellner. Ele estima a reconstrução total do museu em cerca de R$ 400 milhões --pouco mais de 10% do que foi doado para a catedral.
"O Brasil sozinho não tem condição de reconstruir o Museu Nacional. A gente tinha material do Egito, da Itália. Precisaria da ajuda de outros países para enriquecer a coleção", diz.
Além das doações, convênios firmados com o governo brasileiro somam cerca de R$ 80 milhões, mas nem todo este valor está em caixa. Kellner alerta para a dificuldade financeira do museu e diz que precisa de R$ 1 milhão para ações emergenciais, como reforma de prédios e adoção de medidas de segurança.
Ainda que agradeça os repasses realizados pelos brasileiros ("Sem esse dinheiro a gente não estaria trabalhando"), Kellner ressalta que nossa sociedade não tem o costume de fazer este tipo de doação.
"O Brasil não tem uma tradição de mecenato, a gente não doa coisas. Pode doar comida, mas não tem esse espírito desenvolvido no nosso país de mecenato para ações culturais e científicas", afirma.
Além disso, o diretor do Museu Nacional diz acreditar que falta incentivo fiscal para as doações, por meio de abatimento no Imposto de Renda.
Segundo a lei do mecenato francesa, a firma que faz doações para instituições artísticas pode descontar de seu imposto de renda o equivalente a 60% do valor do patrocínio.
Por último, Kellner afirma que o brasileiro tem medo de que o dinheiro doado seja desviado. "O Brasil está na crista da onda em termos de corrupção. As pessoas têm insegurança para doar."
Ele defende que a perda do acervo do Museu Nacional é muito maior do que a resultante do incêndio na catedral. "Para a humanidade, o acervo que nós temos no museu é muito mais representativo. Organismos que viveram há milhões de anos, material etnográfico de tribos indígenas extintas, múmias."
O incêndio destruiu a maior parte do acervo do museu, que contava com mais de 20 milhões de peças, com coleções focadas em paleontologia, antropologia e etnologia biológica.
Foram recuperados mais de 1.500 itens, entre eles o crânio e parte do fêmur de Luzia, possivelmente o fóssil humano mais antigo das Américas já descoberto.
Peritos da Polícia Federal encontraram fortes indícios de que uma série de gambiarras no circuito elétrico provocou o incêndio, a partir de um curto-circuito em um ar-condicionado.
Antes do incêndio, Kellner havia criticado a falta de verbas para a manutenção do espaço. Um terço das salas de exposições estava fechado. Muitas das paredes do museu estavam descascadas, havia fios elétricos expostos e má conservação generalizada.