A faixa escrita em espanhol com os termos “Bienvenida a nuestros hermanos venezoelanos”, acrescida de tradução para o português, e uma salva de palmas recepcionaram o primeiro grupo de venezuelano trazido pelo governo federal ao Rio Grande do Sul assim que eles pisaram em Esteio na noite de ontem. Foram cerca de 20 horas de voo, desde a capital de Roraima, com duas escalas (nas quais ficaram 92 dos 217 viajantes), até que, às 20h11min, 125 homens fugidos da grave crise no país vizinho desembarcaram no aeroporto Salgado Filho.
O avião pousou no terminal 2, longe dos portões e dos olhos da imprensa. A ideia, conforme a força-tarefa federal, era poupá-los de mais cansaço e também preservá-los, já que há entre eles refugiados políticos. Em seguida, foram levados para Esteio.
– A viagem foi um pouco “larga”, foi minha primeira vez em um avião. Mas agora estou muito bem, emocionado – contou Shandy García, 43 anos.
Na Venezuela, o microempresário, vendedor de frutas, deixou quatro filhos e a mulher. A ideia é conseguir um emprego e trazê-los assim que for possível.
– Apostei tudo nessa viagem – resumiu García, referindo-se à ida a Roraima, há oito meses, até a chegada ao Rio Grande do Sul.
Assim como García, o advogado Marcos Carraquel, 34 anos, e a maioria dos venezuelanos, chegou a Esteio vestindo só uma camiseta de manga curta – o termômetro marcava 13 graus. Antes da entrevista e do jantar, servido com sopa típica da Venezuela e o clássico brasileiro arroz e feijão, todos ganharam casacos, doados por moradores e empresas gaúchos.
– Faz muito frio, mas qualquer lugar é melhor do que meu país e do que as ruas de Boa Vista – disse Carraquel, que estava desde janeiro de 2017 em Roraima e, para se sustentar, atuou de garçom a lavador de roupa.
Ele contou que foi em razão de ser consultor político para o poder público que acabou expulso pelo governo do próprio país.
– Estou aqui para ter a oportunidade de uma nova vida – concluiu García, que sonha em trazer para o Estado a mãe, que, acrescenta, passa fome na Venezuela.
Comitiva de recepção
Muito antes de o avião da Força Aérea Brasileira (FAB) pousar, às 20h11min, comitiva da prefeitura de Esteio e outra do Exército aguardavam os venezuelanos na recepção do aeroporto Salgado Filho. Antes de partir para o último destino, foi servido um lanche – com sanduíche e suco.
Coordenador do primeiro alojamento a receber imigrantes no Estado, Cristiano Coutinho Mayer garante que está tudo pronto – os 18 quartos e também o refeitório, que foi reformado.
— Amanhã, começam as palestras, os cadastros e a avaliação de saúde deles para que, enfim, os venezuelanos possam começar a nova vida — diz Mayer.
Chapada, no norte do RS, acolherá grupo
O voo desta quarta-feira foi 10º do processo que pretende aliviar a tensão em Roraima e dar oportunidade para os venezuelanos refazerem suas vidas em um novo destino. Com os grupos que ficaram em Brasília, São Paulo e no Rio Grande do Sul, chega a 1.507 o número de interiorizados.
Esse foi o primeiro de quatro voos já divulgados pelo governo federal que têm como destino o Rio Grande do Sul, somando 646 venezuelanos que serão distribuídos entre Canoas e Esteio. Mais um grupo, integrado por 40 a 50 migrantes, deve chegar ao Estado ainda neste mês, mas ir para longe da Região Metropolitana.
A 330 quilômetros da Capital, o município de Chapada, no norte gaúcho, e seus 9,3 mil habitantes receberão algumas das pessoas que fogem da crise humanitária da Venezuela. Foi a própria prefeitura que ofereceu ajuda. Conforme o prefeito, Carlos Alzenir Catto (PDT), a cidade tem espaço para receber o grupo, além de vagas de emprego na área rural e em fábricas e disponibilidade em creches.
— A maior parte da nossa população é de filhos de imigrantes, de pessoas que saíram da Europa quando a situação não estava muito boa. Nada mais justo do que fazermos esta opção humanitária — explica Catto.
Conforme o governo federal, o perfil solicitado é de famílias com crianças e adultos que possam trabalhar na agricultura, na construção civil e em fábricas de calçados e costura.