Uma imponente construção horizontal encravada na região oeste de Santa Maria, no centro do Estado, aguarda há mais de 500 dias para ser entregue à população gaúcha. O Hospital Regional era – e ainda é – para ser uma referência em alta complexidade e também na área de reabilitação via Sistema Único de Saúde (SUS). Mas um somatório de circunstâncias faz com que o local, projetado para abrigar 270 leitos, siga com as portas fechadas. Idealizado ainda em 2003, a unidade de saúde contabiliza 15 anos de história na qual já se viu de quase tudo. Menos o início dos atendimentos.
— Nossos esforços vão no sentido de termos os primeiros serviços em funcionamento, de forma gradativa, entre a 90 a 120 dias — prometeu o secretário estadual da Saúde, João Gabbardo dos Reis, em entrevista à Rádio Gaúcha em 19 de janeiro.
Enquanto as previsões não se traduzem em leitos ocupados, já se foi uma década e meia de sucessivos anúncios. Pronta – ao custo de R$ 70 milhões, em valores atualizados –, mas fechada, a estrutura representa a única esperança para muitos pacientes que dependem do SUS. Enquanto isso, no outro lado da cidade, na região leste, a única porta de entrada ao atendimento gratuito é o Hospital Universitário de Santa Maria (Husm), ligado à UFSM.
O estabelecimento atende a cerca de 1 milhão de habitantes de 45 municípios das regiões Central e Fronteira Oeste. Em efeito sintomático, o Husm segue, segundo a direção, "enxugando gelo" ano após ano.
Em todo o 2017, o Pronto-Socorro (PS) fechou mais de uma dezena de vezes por estar superlotado. Além disso, há 3,6 mil pacientes que aguardam, desde 2010, a realização de cirurgias nas mais variadas especialidades.
Apesar do quadro, quando aberto, o Hospital Regional não atenderá urgências e emergências, mas garantirá serviços nas áreas de alta complexidade, o que deve ajudar no desafogo à procura pelo Universitário. Até lá, nos 20 mil metros quadrados da estrutura ociosa, os únicos condôminos são os serviços de segurança privada – custeados pelo Estado.
O prédio nem sequer abriu as portas e já terá de passar por reformas pontuais – o gesso do teto, por exemplo, teve parte da estrutura comprometida em um dos temporais que atingiu Santa Maria no ano passado. A prefeitura adianta que irá custear o serviço, estimado em cerca de R$ 50 mil, como uma forma de ajudar o Estado, em crise por suas finanças combalidas.
Um hospital "no limite"
Enquanto o Regional não abre as portas, o Hospital Universitário de Santa Maria (Husm) segue sobrecarregado e atuando "no limite", conforme a diretora da instituição, a médica Elaine Resener. Ainda no fim de 2014, o então governador Tarso Genro (PT) assinou termo de cooperação para que a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), que administra o Husm, fizesse a gestão da nova unidade:
— Sempre tivemos disposição e, mais do que isso, pessoal e profissionais qualificados para colocar em funcionamento o Regional com a estrutura do Husm e com o suporte da Ebserh — garante Elaine.
Voz em defesa da opção do governo de José Ivo Sartori é a do correligionário e ministro do Desenvolvimento Social, Osmar Terra (PMDB), que acompanha o tema desde os tempos de deputado federal (2001-2003 e 2006 até o momento) e secretário estadual da Saúde (2003-2010).
— O Regional não foi pensado para ser um hospital-escola. Seria um erro. O Husm cumpre com o seu papel. Deixem eles, Universitário e Ebserh, lá. O Regional terá gestão eficiente.
Enquanto isso, o Husm segue atendendo 45 municípios das regiões central e da fronteira-oeste. Considerado um hospital geral, a unidade ainda presta serviços de emergência e de alta complexidade. Ao todo, são 403 leitos, segundo Elaine, todos preenchidos:
— A taxa de ocupação é 104%. Sabe o que isso significa? Enquanto o paciente está saindo do leito, o outro (paciente) já está subindo na cama. Praticamente não dá tempo de higienizar.
Aperto no Husm
No aguardo da abertura do Hospital Regional, o Universitário enfrenta demanda em excesso. Confira números de 2017:
- 237 mil consultas
- 16 mil internações
- 7,7 mil cirurgias de emergência, de câncer e eletivas (que não são de urgência).
- 1,8 mil servidores nas áreas médica, de enfermagem, assistência social e administrativa
- R$ 94 milhões de orçamento
O que já está definido
- O Instituto de Cardiologia, de Porto Alegre, ficará responsável pela gestão do Hospital Regional de Santa Maria.
- O modelo será de gestão compartilhada. Ou seja, a Secretaria Estadual da Saúde (SES) acompanhará todas as questões que envolvam o dia a dia e os rumos da instituição.
- Os primeiros serviços à população devem ter início entre 90 e 120 dias.
- A ideia é de que, inicialmente, seja disponibilizado o atendimento ambulatorial com os serviços de neurologia, cardiologia, ortopedia e também a pacientes hipertensos.
- O atendimento, previsto para ser de alta complexidade, será 100% SUS, conforme o Estado.
- Não haverá serviços de urgência e emergência nem a realização de partos.
- Estão previstos atendimentos nas seguintes áreas: buco-maxilo facial, cirurgias (geral, pediátrica, plástica e vascular), cardiologia, endocrinologia, fisiatria, nefrologia, neurocirurgia, oftalmologia, otorrinolaringologia, pneumologia, psicologia, reumatologia, traumatologia e urologia. Também haverá serviços nas áreas da terapia ocupacional, fisioterapia, fonoaudiologia e odontologia.
- Ao todo, serão 270 leitos, dos quais cerca de 20 para as UTIs pediátrica e adulta.
- Os pacientes serão encaminhados por meio das secretarias de Saúde dos municípios.
- As internações também se darão por meio do setor de regulação da Secretaria Estadual de Saúde (SES)
- A contratação de pessoal ficará a cargo do Instituto de Cardiologia que, para a largada dos serviços, deverá selecionar de 200 a 300 profissionais.
- Quando as atividades estiveram em pleno funcionamento, o Regional deve ter entre 1 mil e 1,3 mil funcionários nas diversas áreas, como médica, de enfermagem e administrativa.
- A previsão é de que sejam necessários entre R$ 50 milhões a R$ 60 milhões para compra de equipamentos. Deve haver aporte do Ministério da Saúde para essas demandas.
- O custo para manter o hospital em funcionamento – levando em conta folha de pagamento e outras despesas – deve girar em torno de R$ 8 milhões a R$ 10 milhões por mês.
O que ainda falta definir
- Está previsto que, em até 40 dias, sejam fechados os termos do contrato de gestão e do convênio para atendimento do hospital pelo SUS.
- A princípio, os repasses da União, por meio do Ministério da Saúde, ao instituto observarão os serviços prestados. Ou seja, a instituição receberá por produtividade.
- O contrato entre a SES e o Instituto de Cardiologia definirá os termos de contratação de profissionais e compra e/ou aluguel de equipamentos.