Atual ministro da Justiça, Alexandre de Moraes alcançou a almejada indicação ao Supremo Tribunal Federal (STF) a partir de uma carreira construída com um pé na academia e outro na política. Doutor em Direito e professor universitário, filiado ao PSDB e com trânsito no PMDB, Moraes exerceu cargos de secretário municipal e estadual em São Paulo até chegar à Esplanada, há nove meses.
As boas relações e o currículo foram determinantes para ser o escolhido pelo presidente Michel Temer, de quem é amigo, para integrar a mais alta Corte do país caso tenha o nome aprovado pelo Senado. Quando o polêmico e linha-dura Moraes, 48 anos, desembarcou em Brasília, em maio do ano passado com o afastamento de Dilma Rousseff e sob a bênção de Geraldo Alckmin, já circulava o comentário de que ele esperava usar o Ministério da Justiça como trampolim para "algo maior": a cadeira de governador de São Paulo ou a toga do Supremo. Com a morte do ministro Teori Zavascki e o apoio das cúpulas do PSDB e do PMDB, ganhou a indicação para o STF.
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Descrito por auxiliares como centralizador, detalhista, rígido, vaidoso e, por vezes, truculento, Moraes destoa no temperamento do perfil de Teori Zavascki, que, nas palavras de conselheiros do Planalto, balizava a busca pelo futuro integrante do Supremo. Apesar do estilo oposto ao do antigo relator da Lava-Jato, morto em um acidente aéreo em janeiro, Moraes tem formação acadêmica elogiada no meio jurídico, em especial entre pessoas próximas de Temer.
Paulistano, Moraes concluiu a graduação em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), em 1990, onde ainda obteve títulos de Doutor em Direito do Estado (2000) e Livre-docente em Direito Constitucional (2001). Seu currículo lhe apresenta como professor associado da Faculdade de Direito da USP, professor pleno da Universidade Presbiteriana Mackenzie e professor titular da Escola Superior do Ministério Público de São Paulo e da Escola Paulista da Magistratura.
O jurista indicado por Temer é casado com a advogada Viviane de Moraes e pai de três filhos: Gabriela e o casal de gêmeos Giuliana e Alexandre. Apegado a São Paulo, deixou a família na cidade e vive na ponte aérea com Brasília. Fã de esportes, gosta de corridas e futebol. Inclusive, faz parte do "bando de loucos" do Corinthians.
– Ele é corintiano de fé desde os tempos do Pacaembu. Quando era secretário da Segurança, foi a vários jogos do Corinthians na Arena – relata o deputado Andrés Sanchez (PT-SP), ex-presidente do clube paulista.
Na área profissional, Moraes já atuou como advogado e consultor jurídico. Foi promotor de Justiça em São Paulo por 11 anos, de 1991 a 2002, quando iniciou a parceria com tucanos em altos cargos públicos. Foi nomeado secretário estadual da Justiça na primeira passagem de Alckmin pelo governo paulista. Deixou a função em 2005, ao ser eleito conselheiro do Conselho Nacional de Justiça, em vaga indicada pela Câmara dos Deputados. À época, ainda dispunha de cabelos negros, penteados para o lado. Com o avanço gradual da calvície, o jurista adotou o visual careca, ao estilo "Bruce Willis".
Em 2007, Moraes tornou-se secretário municipal de Transportes na gestão de Gilberto Kassab como prefeito de São Paulo. Chamado de "supersecretário", chegou a liderar as pastas de Transportes e de Serviços e a ser presidente do Serviço Funerário, da SPTrans e da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). Ele se desligou da administração Kassab em 2010, após atritos com colegas.
A relação de confiança entre o advogado e Alckmin lhe abriu novamente as portas do governo do Estado em 2015. Nomeado secretário da Segurança Pública, colecionou polêmicas, em especial com movimentos sociais, que lhe acusavam de excesso de violência diante de protestos. Moraes defende reação enérgica em casos de desobediência civil. Por outro lado, ostentou a redução de índices de criminalidade em São Paulo. O desempenho e o acordo entre Temer e a cúpula do PSDB no impeachment valeram a vaga no Ministério da Justiça. Em 2016, um dos nomes que fez lobby por Moraes na Esplanada foi Eduardo Cunha (PMDB-RJ), então presidente da Câmara.
Dois anos antes, o jurista defendeu com sucesso o ex-deputado, absolvido no STF em um processo por uso de documento falso. Outro ponto polêmico da trajetória de Moraes como advogado é a defesa da empresa Transcooper, cooperativa apontada em uma investigação que envolve o Primeiro Comando da Capital (PCC). Apadrinhado por Alckmin e amigo de Temer, Moraes teve desempenho opaco no Ministério da Justiça, com foco na segurança pública.
Em janeiro, com as chacinas nos presídios, acelerou um plano nacional de segurança, criticado por especialistas por trazer mais pirotecnia do que ações concretas, estratégia que não contou com o endosso de maior parte dos governadores. O anúncio da construção de cinco presídios federais não definiu sequer todos os Estados que receberão as obras.
– Ele tem esse estilo linha-dura, prefere discussões sobre reforço nas fronteiras para impedir a entrada de drogas e armas, redução de índices de criminalidade. Ele não perdeu o cacoete do secretário de Segurança – descreve um aliado.
Nos bastidores, Moraes é tido como um workaholic "sempre online". Chega à pasta por volta das 8h e, quando não está em viagem, costuma avançar além das 22h, com raras pausas para o almoço. Em geral, engana a fome com um misto quente levado ao seu gabinete. Nas discussões, chama atenção pelo conhecimento técnico apurado e por ser exigente, questionando as decisões no detalhe.
– Se um assessor chega com um projeto, ele não aceita a primeira versão, faz perguntas ao extremo, checa cada aspecto em jogo. Tem vezes que cinco assessores não dão conta de argumentar. Apesar de ser constitucionalista, ele domina o direito do trabalho, penal, cita a legislação em todos os casos – afirma um antigo auxiliar.
Moraes também tem fama de impaciente e pragmático. Apesar de ser educado no trato, não esconde a insatisfação com os subordinados, muitas vezes alvos de carraspanas em público. Fechado, despacha diretamente apenas com nomes de confiança de sua equipe. Com os demais, gosta de distribuir ordens por WhatsApp. Em nove meses de Brasília, o ministro também ganhou fama de boquirroto, provocando calafrios no Planalto a cada entrevista. Em um domingo de setembro de 2016, durante um evento político em Ribeirão Preto, afirmou a integrantes de movimento pró-impeachment que haveria naquela semana uma nova fase da Lava-Jato.
No dia seguinte, o ex-ministro Antonio Palocci foi preso na 35ª fase da operação. Com a morte de Teori, o nome do titular da Justiça entrou na lista de possíveis indicados ao Supremo. Até o fim de semana, o favorito era Ives Gandra Filho, presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST). A pressão tucana e do PMDB do Senado, além da confiança de Temer em Moraes, mudaram o destino da indicação para a Corte.
*Zero Hora