"Você está demitido." O bordão que o bilionário Donald Trump usava no programa O Aprendiz foi repetido por multidões que saíram às ruas para protestar contra a eleição do republicano nos Estados Unidos. Na quarta-feira, horas após a confirmação da vitória do magnata, pelo menos sete cidades americanas registraram manifestações. As principais concentrações ocorreram em cidades em que os democratas venceram as eleições. Novos atos anti-Trump estão programados para os próximos dias.
Ex-embaixador do Brasil em Washington, Rubens Barbosa afirma que esse movimento é inédito na política recente do país. Ele lembra que, na eleição de 2000, quando George W. Bush também perdeu nas urnas, mas obteve maioria no colégio eleitoral, o resultado foi bastante contestado. No entanto, não foram realizadas marchas como ocorre agora. Com a apuração ainda em andamento, Hillary Clinton seguia na frente nos votos populares até a tarde desta quinta-feira, com uma vantagem de 0,2 ponto percentual (47,7% a 47,5%).
– O que está acontecendo é inédito. Nunca houve esse tipo de protesto. É uma contestação para a democracia. Isso também mostra o grau de divisão que existe hoje no país e as cicatrizes que os debates duros deixaram na sociedade americana – afirma o ex-embaixador.
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Presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice), Barbosa acredita que as manifestações vão acabar arrefecendo com o tempo, mas pondera que tudo depende da agenda de Trump – até este momento, imprevisível. Para o diplomata, o próprio Trump – que afirmou que não iria reconhecer o resultado da eleição em caso de vitória da adversária – é responsável pela explosão de protestos, bem como a imprensa, que alimentou a expectativa de vitória de Hillary.
Na avaliação da consultora política Gil Castillo, as manifestações refletem a insatisfação com o sistema eleitoral americano, em um momento em que a democracia representativa passa por um profundo questionamento no mundo inteiro. Presidente do conselho de administração da Associação Latino-americana de Consultores Políticos, Gil destaca que o presidente Barack Obama terá um papel fundamental durante a transição "para manter os ânimos":
– Aquele conceito de Estado clássico está muito fragmentado em todos os sentidos. Você tem muitas vertentes dentro da sociedade clamando por representação nos seus nichos.
Novos atos são marcados pelo Facebook
No Facebook, começam a pipocar eventos convidando os americanos a protestarem contra a eleição de Donald Trump. "Not my president" (não é meu presidente) é a frase mais utilizada para nomear os atos. Há dezenas de manifestações agendadas para os próximos dias – e uma, inclusive, programada para a data posse do republicano, no dia 20 de janeiro. Mais de 4 mil pessoas já confirmaram presença no chamado Dia da Posse.
"Nos recusamos a reconhecer Donald Trump como o presidente dos Estados Unidos e nos recusamos a receber ordens de um governo que coloca os fanáticos no poder", escreveram os organizadores. "Temos de deixar claro ao público que não escolhemos esse homem para o cargo e que não vamos defender suas ideologias".
Mas a estratégia de ir para as ruas protestar contra o resultado não é consenso entre os opositores de Trump. Em um grupo com mais de 80 mil pessoas, um dos integrantes afirmou: "Você não pode protestar, estimular mais a divisão e esperar um resultado diferente na próxima eleição. Lutar e protestar é totalmente inútil nesta fase e só vai ampliar a divisão entre democratas e republicanos."
Outro membro respondeu à provocação: "Não, você está errado. Protesto tem sido e continuará a ser uma tática política válida para manobrar a política popular. É um direito protegido da Primeira Emenda, que não é exercido com frequência suficiente".