CORREÇÃO: O último gráfico na tabela desta reportagem mostra somente a evolução da receita, os gastos e o déficit do governo do Estado com a rede hospitalar pública (13 hospitais), e não as despesas gerais da Secretaria da Saúde, como informado nesta matéria até as 17h30 de quarta-feira (13).
Os investimentos do governo de Santa Catarina em entidades filantrópicas na área da saúde aumentaram 53% de 2012 a 2015. Os dados são de uma pesquisa recente do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). No mesmo período, os repasses a municípios recuaram.
Encomendado pelo Sindicato dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Saúde Pública Estadual e Privado de Florianópolis e Região (Sindsaúde), o estudo revela ainda que os serviços terceirizados, como o atendimento pelo Samu, frequentemente são prestados em um número acima do previsto em contrato. O secretário de Saúde, João Paulo Kleinübing, defende que os dados não significam uma tendência de terceirização da saúde, citando outras fontes de liberação de investimentos pelo governo para entes públicos.
Concluído no fim de maio, o levantamento ainda não tinha sido publicado. Para a presidente do Sindsaúde, Edileuza Fortuna, o resultado é preocupante:
– O sindicato entende que se trata de uma política privatista, que busca, de fato, esvaziar o fundo público deliberadamente, para assim tentar justificar a privatização.
No entanto, o coordenador do Curso de Especialização em Administração Hospitalar e de Sistemas de Saúde da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Walter Cintra, explica que optar por terceirizar não significa estar certo ou errado. Para o especialista, o mais importante é o controle da eficiência.
– Privatizar um serviço não é uma garantia por si só. O inverso também não é. Quando se terceiriza algo, é importante fazer um gerenciamento e fiscalização para ter os dados necessários que permitam avaliar se houve melhora no atendimento. Afinal, esse é o único objetivo que justifica uma terceirização – explica.
Descompasso entre serviços prestados e contratados
Outra questão abordada pelo relatório do Dieese são as diferenças entre serviços prestados por organizações sociais (OS) e outras instituições sem fins lucrativos. Um dos principais exemplos desse descompasso está nos atendimentos prestados pelo Samu, que é administrado desde 2012 pela Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM). No ano passado, a associação informou ter realizado 243.644 atendimentos em todo o Estado, número 18% maior do que o contratado pelo governo: 207 mil atendimentos (veja mais ao lado).
Desde o começo da terceirização, o contrato foi criticado em auditorias do Tribunal de Contas do Estado (TCE) e em ação do Ministério Público Estadual (MPSC), após denúncia da presidente da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa (Alesc), Ana Paula Lima (PT). No questionamento, em junho do ano passado, a deputada critica o aumento de gastos com o serviço, que seriam de R$ 36 milhões em 2011, quando era por gestão pública, e passou a R$ 112 milhões em 2014, já com a administração da SPDM.
O secretário João Paulo Kleinübing criticou o atual modelo de contrato, adiantando que o governo deve buscar novas soluções para o serviço de atendimento móvel no Estado a partir do segundo semestre de 2017, quando se encerra o prazo do atual contrato com a SPDM.
Para Mario Monteiro, superintendente da SPDM responsável pela execução do contrato com o Estado, o serviço cumpre com todas as exigências previstas:
– Todas as questões que foram judicializadas já tiveram decisão favorável à SPDM. Cumprimos o número de chamadas e atendimentos previstos no contrato.
Dívida com municípios pode acabar na Justiça
Um inquérito foi aberto na 33a Promotoria de Justiça da Capital para apurar dívida do Estado com municípios na saúde. O motivo foi uma representação entregue pelo Conselho de Secretarias Municipais de Saúde de SC (Cosems/SC), que reclama o calote do governo em repasses do cofinanciamento de atenção básica em saúde para os 295 municípios. A última parcela paga pelo Estado foi a de janeiro.
A Secretaria de Saúde já adiantou que os pagamentos devem retornar a partir deste mês de julho, com o pagamento de duas parcelas a cada mês, com o objetivo de sanar toda dívida até o final do ano. Apesar das negociações avançadas, secretários municipais ainda não estão contentes com o resultado. Segundo Sidnei Bellé, presidente do Cosems, o impasse é sobre o valor que o governo deveria repassar. Eles defendem um reajuste acordado no ano passado. Por isso, uma possível judicialização por parte das prefeituras não está descartada, porque 2016 é um ano de término de mandato municipal, então a Lei de Responsabilidade Fiscal não permite que os prefeitos deixem dívidas para os sucessores.
Entrevista: João Paulo Kleinübing, secretário estadual da saúde
Gastos crescendo e receita diminuindo, o resultado dessa conta é um déficit apontado pelo TCE em mais de R$ 200 milhões, apenas na área da saúde, até maio deste ano. Em entrevista ao DC, o secretário João Paulo Kleinübing defende mudanças no modelo de gestão da saúde catarinense e garante que todas as dívidas serão pagas. No entanto, reclama do excesso de gastos com a judicialização na área e informa que o maior vilão do crescimento de gastos é a folha salarial, responsável por cerca de 70% das despesas.
Em tempos de redução de arrecadação, qual a principal dificuldade da Secretaria de Saúde para diminuir despesas?
Acredito que temos que fazer novas discussões sobre o modelo de gestão pública na área da saúde. Apesar da redução de servidores, a folha aumentou pela incorporação da última parcela do acordo da greve de 2012. Na época, funcionários não médicos ganharam reajuste de 100%, sendo 25% a cada ano. Este ano demos a última parcela. Na remuneração dos médicos também houve reajuste, o que resultou em um ganho na produtividade. Isso também se refletiu em um número de cirurgias maior. Por exemplo, em 2015 houve aumento de 30% em cirurgias nos nossos hospitais em comparação com 2014. Isso significou também um impacto no aumento do uso de medicamentos, elevando naturalmente os custos das nossas unidades. Estamos tentando fazer uma gestão em cima disso.
A pesquisa mostrou um crescimento de investimentos em entidades sem fins lucrativos e retração no repasse a municípios. Isso significa uma tendência da Secretaria de Saúde em apostar na terceirização de serviços?
Não é terceirização. O repasse às entidades sem fins lucrativos aumentou desde 2012 porque tivemos a inauguração do Hospital Florianópolis em 2013 e pelo o próprio Samu, que passou para a SPDM em 2012. Foram dois serviços grandes implantados a partir de OS. Além disso, no Cepon houve um aumento significativo na qualidade do serviço. Sobre os municípios, é possível constatar que diminuímos os repasses, mas o que essa pesquisa não mostra é que o governo fez investimentos pelo Pacto de Santa Catarina. Então o que ocorreu foi apenas uma troca de fonte de investimento.
A pesquisa mostra ainda um descompasso entre serviços prestados e contratados. Um dos principais casos é o Samu. Como o governo avalia isso?
Temos uma conversa adiantada com os municípios para mudar uma possível troca da gestão do Samu a partir de junho de 2017, quando encerra o atual contrato com a SPDM, para que haja uma gestão consorciada desse tipo de atendimento. Há um modelo em Minas Gerais para administração do Samu e acho que podemos usar ele como exemplo aqui. Pelo alto custo, é inviável permanecermos com o atual contrato do Samu.
Como fica a situação da dívida do governo na área da saúde após o alívio provocado pela renegociação da dívida com a União? O governador Raimundo Colombo chegou a dizer em entrevista que a Saúde seria uma pasta prioritária. Já há algum projeto para a utilização desta verba?
Ainda não tenho uma resposta do governador, mas acredito que devemos resolver esse problema com os municípios a partir deste mês. O nosso planejamento é efetivar o pagamento de duas parcelas do repasse do cofinanciamento da atenção básica em saúde com os municípios a partir de julho, assim vamos terminar o ano sem pendências com os municípios.