Relator da comissão especial que analisa o impeachment no Senado, Antonio Anastasia (PSDB-MG) deu parecer favorável ao afastamento da presidente Dilma Rousseff. O relatório apresentado por ele, contendo 126 páginas, foi lido em sessão realizada na tarde desta quarta-feira. No documento, ele considerou que há requisitos legais para a admissibilidade da denúncia e também indícios suficientes de autoria e materialidade de fatos criminosos.
A denúncia, aprovada na Câmara dos Deputados, acusa Dilma de violação dos artigos 85 e 167 da Constituição Federal e da lei 1.079, pela suposta abertura de créditos suplementares por decretos presidenciais sem autorização do Congresso Nacional e pela contratação ilegal de operações de crédito, as chamadas "pedaladas fiscais".
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Na quinta-feira, às 10h, a comissão especial voltará a se reunir para ouvir a defesa da presidente. O relatório de Anastasia deve ser votado na sexta-feira. O passo seguinte é a votação no Plenário, prevista para ocorrer no dia 11 de maio.
Confira os principais argumentos do relatório de Anastasia:
Decretos de crédito
"Todos os seis decretos arrolados na denúncia são potencialmente deficitários porque contam com essas duas origens de recursos: superávit financeiro e excesso de arrecadação, este último tido como conjunturalmente inapto para abertura desses créditos porque, no momento em que foram abertos, tal excedente, do ponto de vista fiscal, em verdade não existia. Vale lembrar que, em 22/07/2015, o Poder Executivo já reconhecia a ausência de espaço fiscal. Tomados isoladamente, três dos decretos examinados se mostram neutros em relação ao resultado primário contido na lei orçamentária e três apresentam repercussão negativa, no valor total de R$ 977,8 milhões, sobre a consecução da meta de resultado primário de 2015, também no plano do orçamento. Nesses termos, ao menos três dos decretos em comento não teriam observado a condição exigida pelo artigo 4º da Lei Orçamentária Anual (LOA) 2015. Deve-se destacar, contudo, que dois dos três decretos tidos como neutros utilizam-se de excesso de arrecadação de receitas primárias. Tendo sido configurada, contudo, a inexistência de espaço fiscal, a utilização do excesso de arrecadação merece reparos. Significa dizer que, sob interpretação mais restritiva, não apenas três, mas cinco decretos apresentam repercussão negativa, no valor consolidado de R$ 1.814,4 milhões, relativamente à obtenção da meta de resultado primário, em inobservância à condicionante fiscal gravada no artigo 4º da LOA 2015."
Supostas operações de crédito ilegais (pedaladas fiscais)
"Quanto à contratação de operações de crédito, a suposta ilegalidade teria decorrido, principalmente, da inobservância do disposto no artigo 36 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o qual veda a realização de operação de crédito entre uma instituição financeira estatal e o ente da Federação que a controle, na qualidade de beneficiário do empréstimo. É importante recuperar que, em 2014, conforme apontado pelo TCU, as operações de crédito contestadas teriam permitido que a dívida pública federal fosse subdimensionada em R$ 40,2 bilhões e o resultado primário do exercício em R$ 7,1 bilhões. Demais disso, a maior parte dessas dívidas teria sido constituída em desacordo coma LRF, na medida em que esta lei veda operações de crédito entre os entes da Federação e as instituições financeiras por eles controladas. Em que pese essa redução verificada em dezembro de 2015, a elevação do passivo da União ao longo do ano reforça os indícios de crime de responsabilidade narrados na denúncia, tendo em vista que essas operações de crédito já vinham sendo questionadas pelo TCU antes da apreciação final das contas presidenciais de 2014. O aumento do passivo entre dezembro de 2014 e novembro de 2015, registre-se, foi de R$ 6,5 bilhões."
Dilma teria conhecimento da dívida
"A partir do exame das operações de crédito e considerando que a presidente da República, nos termos do artigo 84, II da Constituição, deve exercer a direção superior da administração federal, não é razoável supor que a presidente da República não soubesse que uma dívida da ordem de R$ 50 bilhões junto a bancos públicos federais pairava na atmosfera fiscal da União, até mesmo porque esse endividamento foi utilizado como forma de financiamento de políticas públicas prioritárias."
Desvio de finalidade
"As práticas descritas na denúncia e imputadas à presidente da República em 2015, como operações de créditos ilegais, revelam não apenas indícios robustos no sentido de postergar o pagamento dos débitos assumidos perante as instituições financeiras controladas pela União, neste caso, o Banco do Brasil. Isso porque, os fatos reiterados em 2015, por meio dos atrasos dos valores devidos referentes à equalização da safra agrícola perante aquela instituição financeira, também praticados em 2014, revelam contexto que pode demonstrar desvio de finalidade em favor de interesses políticos partidários, na medida em que, em contexto eleitoral, sonegaram informações à sociedade brasileira, a constituir pano de fundo relevante para apuração dos fatos praticados em 2015."
Irregularidade nas contas de 2014
"Ocorre que foi apenas após a intervenção do TCU, órgão autônomo de controle externo e auxiliar do Congresso Nacional, que o Poder Executivo procedeu à equalização dos passivos, como visto, em conformidade com os Acórdãos nº 825 (de 15/04/2015) e nº 3.297(09/12/2015). Tais operações, repise-se, foram julgadas ilegais no âmbito da Corte de Contas da União. Vale destacar que a matéria foi alçada às contas presidenciais de 2014. Nesse contexto, o Acórdão nº 1.464/2015-TCU-Plenário, de 17/06/2015, comunicou ao Congresso Nacional que as contas presidenciais de 2014 não estavam em condições de serem apreciadas naquele momento, em virtude dos indícios de irregularidade apresentados no Relatório Preliminar, razão pela qual foi aberto o prazo de 30 dias para apresentação de contrarrazões por parte da Presidente da República. Ao final, o Acórdão nº 2.461/2015-TCU-Plenário, de 07/10/2015, opinou pela rejeição das contas presidenciais de 2014. Destacou-se o fato de que o TCU havia apontado a irregularidade, ensejadora de rejeição de contas, de algumas operações dessa natureza em razão de dois motivos principais: pelo fato de não terem sido contabilizadas nas estatísticas fiscais oficias relativas a dívida e déficit público; e por serem caracterizadas como operações de crédito vedadas pela LRF."