Na véspera do Dia do Trabalhador, no sábado passado, Everton Luis Stefani Ayres, 35 anos, recebeu em sua casa, no Parque dos Anjos, em Gravataí, um telegrama para informar sua demissão da General Motors (GM) após uma década de trabalho. Ele faz parte do grupo de 300 funcionários que regressariam nesta segunda-feira ao trabalho depois de cinco meses de layoff (quando os contratos de trabalho são suspensos temporariamente), mas foi dispensado.
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Desde 1º de dezembro do ano passado, 825 trabalhadores ficaram parados (o prazo se estendia até 30 de abril). Por meio de nota, a GM informou que mais da metade dos cerca de 800 empregados que haviam entrado em layoff em 2015 retornou ao trabalho, mas que "houve queda de mais de 26% nas vendas da indústria apenas nos primeiros quatro meses de 2016" e que a "esperada recuperação do mercado, infelizmente, não aconteceu".
O Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí (SINMGRA) rebate os dados e tenta reverter as demissões na Justiça.
– Nós queremos a readmissão dos trabalhadores. São 300 pais e mães de família, são 300 histórias. Queremos manter a empregabilidade. Essa crise não vai durar para sempre – afirmou o presidente do sindicato Valcir Ascari, em entrevista coletiva, destacando a falta de consideração da montadora ao comunicar os desligamentos por telegrama.
Pai de três filhos – João Vitor, dez anos, Miguel, dois anos e meio e Murilo, dez meses – Everton vinha sustentando sozinho a família trabalhando como facilitador, atuando no time de martelinho de ouro no terceiro turno, que deixou de existir em dezembro de 2015. A esposa de Everton, a professora Vanessa Ribeiro Ayres, 32 anos, deixou de lecionar assim que engravidou do caçula. A decisão da família de que ela ficaria cuidando dos dois menores terá de ser mudada. Agora, o casal vai se revezar no cuidado dos filhos enquanto cada um procura uma vaga para recolocação no mercado de trabalho.
– É muito ruim. Eu nunca tinha sido demitido. Eu tinha que fazer alguma coisa. Aí, no curso de empreendedorismo (qualificação oferecida durante o layoff) pensei em começar a lavar carros – contou o trabalhador, que teve os rendimentos cortados pela metade durante o layoff, quando recebeu uma modalidade de seguro-desemprego bancada pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (Fat).
A preocupação de Everton se deve também ao fato de o filho Miguel precisar de um leite especial, além de usar fraldas, como o mais novo. A lavagem de carros foi uma saída para melhorar o orçamento, mas ele busca um emprego o mais rápido possível.
– Como pai de três crianças, o sentimento é de não deixar faltar nada para eles – desabafa.
De acordo com o Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí, trabalhadores das 17 sistemistas que compõem o complexo automotivo poderão sofrer o impacto dos 300 desligamentos na GM e a extinção do terceiro turno.
"E agora, pai?"
Durante três anos, Elerson Rocha Rodrigues, 30 anos, morador da Vila Farrapos, na Capital, trabalhou como operador na GM, no lixamento e polimento dos carros. No sábado passado, também recebeu o telegrama comunicando sua demissão.
– Meu filho (Eric, 12 anos) estava comigo e disse: "e agora, pai?". Ele ficou em choque, apreensivo. A gente fica meio apavorado. Conheço muita gente que está desempregada, procurando trabalho, e está difícil. Mas acredito no meu potencial.
Além da despesa com a pensão alimentícia do filho, Elerson, que mora com os pais, a irmã e os sobrinhos, ajuda nas despesas da casa. Mesmo que sua vontade seja continuar atuando na indústria, a intenção é arrumar um emprego o mais rápido possível.
– Meu pai é aposentado, vou ter que depender dele até arrumar serviço. Agora a gente ficou com uma mão na frente e outra atrás – lamentou.
Mais de cem demissões no primeiro trimestre
De acordo com o economista do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Ricardo Franzoi, que também participou da coletiva, nos últimos 12 meses a montadora já havia desligado cerca de 800 funcionários na fábrica de Gravataí – 102 apenas no primeiro trimestre deste ano.
Em relação às demissões de metalúrgicos em Gravataí, o economista apontou que foram 3.975 desligamentos em 2014, outros 3,4 mil em 2015 e que no primeiro trimestre de 2016, já chega a 680 demitidos (sem contar esses 300 da GM).
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