Duas semanas depois de provocar o atropelamento um casal no Parcão, em Porto Alegre, o empresário Thiago Brentano, 39 anos, assume publicamente que errou ao ter ingerido bebida alcoólica e dirigido o carro, com a CNH suspensa, naquela noite. Mesmo assim, diz que tem certeza que estava "totalmente em condições de dirigir".
Em entrevista exclusiva a Zero Hora, Brentano classifica o fato como uma "infelicidade" e nega que estaria disputando um racha, como sustenta a polícia. Visivelmente nervoso, no escritório do seu advogado, Jader Marques, afirma que "em nenhum momento" percebeu que havia pessoas feridas.
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Diz, ainda, que irá procurar as vítimas, Thomaz Coletti e Rafaela Perrone, para pedir desculpas e oferecer ajuda. Brentano alega que entrou em desespero e que, por isso, fugiu do local da colisão, deixando um amigo para trás, e se hospedou em um hotel próximo ao parque.
Leia a íntegra da entrevista concedida a ZH:
Por que o senhor estava dirigindo com a CNH suspensa? Por que o senhor bebeu e dirigiu naquela noite?
Sobre estar dirigindo, já afirmei para o delegado que estava errado. Assumo meu erro. Não tenho o hábito de dirigir. Esse carro, só para vocês saberem, é um carro que comprei para negócio. Tinha um outro carro, no valor de R$ 60 mil que vendi, e comprei esse por R$ 90 mil. Ando bastante de Uber. Tenho como comprovar. Inclusive, no dia do acidente, andei de Uber várias vezes. Uber, carona, táxi, lotação, ônibus, enfim... Realmente tive essa infelicidade de pegar esse carro para ir nessa festa que nunca tinha ido. Não conhecia a casa. Sobre a questão da cerveja, bebi duas, mas não estava embriagado. Bebi no início da festa. Quando entrei na festa existia uma consumação de R$ 200. Consumi, paguei por 10 cervejas e como tinha R$ 200 acabei dando as cervejas para várias pessoas. Então, após a saída da festa, tinha combinado de sair com o Sandro (motorista do Camaro), de a gente comer um Subway. Mas estava totalmente em condições de dirigir. Em nenhum momento estava com dificuldades de direção.
O senhor estava disputando um racha?
Não. Não estava disputando. O Sandro é um amigo pessoal, a gente se encontrou, ele saiu pouco depois de mim. Deixei meu carro em frente à festa. Estava com o Diego, que era o carona, e aí, assim que o Sandro retirou o carro dele do estacionamento chamei o Diego e avisei que iria levá-lo em casa e que iria comer um Subway com o Sandro. Quando arranquei da Silva Jardim e dobrei na 24 (de Outubro), o Sandro já estava lá na frente e a gente foi se encontrar, mais ou menos, na altura da Tok & Stok. Basicamente, a gente deu uma paradinha rápida e aí a gente arrancou. Logo em seguida, o Sandro dobrou à direita na Bordini, inclusive tem como comprovar isso. Segui reto e mais ou menos na altura do União vi um carro branco colando em mim. Estava, realmente a uns 80 km/h, e o cara colou atrás de mim. Peguei e acelerei porque me assustei com ele. Tanto que me perdi naquela curva. Fui olhar no retrovisor para ver se ele estava atrás de mim mesmo e me deu um sexto sentido. Achei que ele ia me assaltar. Aí, quando alinhei o carro, olhei no retrovisor, o cara ainda estava atrás de mim e quando fui olhar para a direção só vi o táxi me pegando. Não vi o sinal. A única reação que tive, acho que foi reflexo mesmo. Basicamente, o carro rodou. Quando parou, saí justamente porque estava sem carteira de motorista, estava ciente disso, e tinha tomado duas cervejas. Não vi em nenhum momento que tinha pessoas machucadas. Em nenhum momento. Garanto. Não enxerguei essas pessoas. A única coisa que vi foi o Diego saindo do carro. Fui até ele, perguntei se ele estava bem e ele disse que sim. Aí acabei indo embora. Única coisa que vi é que um táxi me bateu e que bati num carro estacionado. Tive uma reação de desespero, principalmente, pensando na situação de terceiros. De pelo menos resolver os danos materiais, que foi o que enxerguei naquele momento. Não enxerguei o casal. De forma nenhuma. Não visualizei.
Por que o senhor fugiu do local? Por que deixou seu amigo sozinho, se não viu mais ninguém?
Me desesperei, na verdade. Fiquei bastante assustado com o que aconteceu. Então, naquele momento, como não enxerguei danos para terceiros, o carro que mais estragou foi o meu. Então, identifiquei que o taxista não se machucou. E como foi batida em um carro estacionado, o momento de fugir foi pensando no dano material. Pensei nisso porque não sou um cara que tem condições, trabalho desde os 10 anos de idade. Então, pensei principalmente em suprir a questão do seguro para pagar terceiros. Estou preocupado, muito preocupado com o casal. Tentei contato, mas infelizmente não tive acesso. Fiquei sem dormir, não estou conseguindo me alimentar. Estou disposto a amenizar essa situação que não esperava. Não esperava atropelar terceiros, mas realmente aquele carro que me seguiu veio numa forma que colou na minha traseira e me desesperei. Fiquei assustado. Não conhecia essa pessoa, não sei nem quem é. Era um carro branco, um Audi branco. Então é isso. Peço para os pais, para a mãe, os familiares e principalmente a ambos. Peço humildemente desculpas pelo que fiz, apesar de saber que não vão me desculpar. Me coloco no lugar deles. Mas o que puder fazer para amenizar essa situação estou disposto a fazer.
O senhor foi flagrado três vezes por embriaguez ao volante e acumula 52 multas no histórico de motorista. Por que seguia dirigindo?
Tive a infelicidade de pegar o carro naquele dia. Estava andando de Uber, de táxi, de carona. Sobre as multas é desde que tenho 18 anos. Sobre as Baladas Seguras, realmente, mas tomei uma, duas cervejas. Foi uma situação atípica que aconteceu. Então é isso. Tive a infelicidade de sair. Foi um erro da minha parte. Estou assumindo que saí sem carteira naquele dia. Mas como te falei: não estava bêbado. Em nenhum momento estava sem condições de dirigir. Estava totalmente sóbrio. Trabalhei 12 anos na Listel com vendas externas em todo o Rio Grande do Sul, sempre dirigindo.
Por que o senhor se hospedou em um hotel logo depois do fato?
Porque estava sem a chave de casa. Tentei ligar para algumas pessoas. A chave estava no carro, meus pertences todos no carro. Enfim, acabei entrando no hotel para me acalmar. E fiquei acordado até 8h, 8h e pouco. Aí chamei um chaveiro e fui para o meu apartamento e fiquei lá. Fiquei três noites direto sem dormir. No meu depoimento à polícia tinha tomado remédio porque estava sem condições de falar. Sem dormir e sem comer. Perdi quatro quilos em três ou quatro dias. Mal tomava água.
Depois que o senhor tomou conhecimento da dimensão do fato e viu que havia vítimas, como reagiu?
Até é uma coisa que digo, danos materiais a gente repara. A gente trabalha e busca. Mas pessoas, o que aconteceu com eles não têm. Agora que fiquei sabendo. Hoje vi a entrevista da Rafaela. Até então não sabia da gravidade, não sabia como ela estava. É uma coisa que não sai da minha cabeça. Tentei por terceiros fazer contato, saber como ela estava, se estava bem. Nesse momento, graças a Deus que tinha aquele Peugeot parado. Não sei o que faria se acontecesse alguma coisa pior. Não sei minha cabeça como iria ficar. Estou abalado e gostaria de, principalmente, para os pais, para eles, tenho filhos, sei como funciona isso, imagina alguém encostar num filho, em um irmão teu… Não sei o que posso fazer para amenizar essa situação. Nunca esperava.
Quem bebeu as outras oito cervejas da sua comanda?
Algumas pessoas lá. A própria Júlia (testemunha que já depôs à polícia), que tem uma declaração dela à polícia. Dei algumas cervejas para ela. O que acabei fazendo? Pegava e dava. Dei até para pessoas que nem conhecia. Ia deixar para a casa? Ia ter de pagar o valor e acabei dando. Então teve a Júlia, que fez a declaração, e pessoas que nem sabia que estavam junto com o pessoal. Nessas alturas, entrei na casa pela meia-noite e pouco, meia-noite e quarenta, saí em torno de três e meia. Se for analisar, aquilo é uma festa grande, esse horário está apenas começando. Não estava no clima de festa por alguns problemas pessoais. Saí para dar uma desopilada com os amigos.
O que seu amigo falou por tê-lo deixado sozinho?
Ele falou que estava bem. Em nenhum momento deixaria ele ali se estivesse com alguma coisa grave. Ele disse que estava bem e que eu poderia ir. Disse que estava com um pouquinho de dor. Em nenhum momento pediu para ficar. A partir do momento que vi que ele não estava gravemente machucado, acabei indo justamente porque queria indenizar os terceiros, que era o táxi e o Peugeot estacionado.
O que o senhor pretende fazer agora que foi indiciado por duas tentativas de homicídio triplamente qualificado e com o pedido de prisão preventiva solicitado pela polícia?
Não sei. Realmente não sei. Não posso fazer nada. Não vou fugir. Vou assumir. (Segundo o advogado Jader Marques, que defende Brentano, ele irá aguardar o cumprimento da decisão judicial em casa. Se a prisão for efetuada, Jader pretende ingressar com um habeas para garantir que o motorista do Audi possa responder ao processo em liberdade).
*Zero Hora