Em conversa com um grupo de jornalistas, nesta quarta-feira, no Palácio do Planalto, a presidente Dilma Rousseff disse estar confiante em uma vitória na Câmara contra o pedido de abertura de processo de impeachment. Caso isso aconteça, Dilma vai propor um amplo pacto nacional com todas as forças políticas, inclusive da oposição. Indagada se participaria de um pacto no caso de derrota, Dilma respondeu:
– Se eu perder, sou carta fora do baralho.
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A presidente destacou que a proposta de repactuação será apresentada após a votação do impeachment na Câmara.
– Digo qual é o meu primeiro ato pós-votação na Câmara. A proposta de um pacto, de uma nova repactuação entre todas as forças políticas, sem vencidos e sem vencedores. Seja pós-Câmara, mas também pós-Senado, sobretudo. No pós-Senado é que isso será mais efetivo – disse ela.
De acordo com Dilma, a proposta de repactuação vai se estender à oposição. Às vésperas da votação que vai selar seu destino político, Dilma recebeu os jornalistas para uma conversa em seu gabinete que se estendeu por mais de duas horas no final da manhã e início da tarde, na qual falou sobre suas expectativas para os próximos dias.
Aparentando tranquilidade e, em vários momentos, bom humor, Dilma se mostrou confiante no resultado da votação, a despeito das notícias negativas dos últimos dias, como a decisão do PP de desembarcar do governo.
Dilma disse que vai lutar até o fim pela manutenção do mandato em todas as instâncias possíveis e descartou fazer como o ex-presidente Fernando Collor, que renunciou depois de ser derrotado na Câmara, em 1992, e pouco antes de começar a ser julgado pelo Senado, no fim daquele ano.
– O governo vai lutar até o último minuto do último tempo por uma coisa que acreditamos que seja factível, que é ganhar contra esta tentativa de golpe que estão tentando colocar contra nós através de um relatório que é uma fraude – afirmou a presidente.
Dilma comparou o momento a uma guerra psicológica na qual os dois lados tentam usar os números a seu favor para influenciar os indecisos.
– Nós agora, nessa reta final, estamos sofrendo e vamos sofrer uma guerra psicológica que tem um objetivo, que é construir uma situação de efeito dominó – disse.
A presidente minimizou a saída do PP do governo.
– É muito difícil, neste momento, você dizer que um partido desembarcou do governo. Tem situações as mais variadas. Os partidos saem do governo, e as pessoas ficam – disse.
Dilma não descartou a possibilidade de recorrer ao Judiciário em caso de derrota no Congresso. Ela citou supostas falhas no rito do impeachment em relação ao direito de defesa como possível argumento para a judicialização do caso.
– Não garanto ainda o que nós vamos fazer, porque não tenho a avaliação completa do jurídico do governo. Não sabemos se vamos. E se formos, quando – disse.
Durante a conversa, Dilma foi perguntada sobre o cenário em caso de derrota e também sobre seus planos para o futuro, se conseguir terminar o mandato.
– Vou embora para a minha casa em Porto Alegre. Tenho direito à aposentadoria.
Economia
Dilma admitiu que o país vive a interação entre uma instabilidade política extremamente profunda – que já dura 15 meses – e a crise econômica.
– Eu não digo que a crise econômica derive integralmente da política, acho que ela é intensificada, acho que ela é bastante piorada, agora, sobretudo eu acho que a nossa capacidade de recuperação se mostrou limitada pela crise política – afirmou a presidente.
Dilma repetiu o discurso de que a crise econômica é cíclica, que primeiro atingiu os países desenvolvidos e depois as nações em desenvolvimento.
A presidente avaliou que as ações do governo adiaram os efeitos da crise, mas que o Brasil ainda tem várias "disfunções" que precisam ser superadas.
– Acredito que tivemos um aprofundamento da crise derivado do fato de que nós, ao fazer a política anticíclica, nós derrubamos bastante a arrecadação do país – afirmou.– Nós tivemos um nível de redução de impostos bem elevado – afirmou.
Entre as medidas citadas por ela para tentar mitigar e adiar os efeitos da crise no país, as quais tiveram como resultado a queda na arrecadação, estão o Programa de Sustentação do Investimento (PSI), com juro de 2,5% ao ano, e a redução do imposto sobre bens de capital de 30% para 4%. Essas medidas, para ela, seguraram o emprego.
A presidente avaliou ainda que a economia internacional começa a dar sinais de que vai diminuir o crescimento do lado dos emergentes, processo que necessariamente terá de ser enfrentado pelo governo.
– Ninguém saiu de processo de crises sem enfrentá-las.
Por outro lado, segundo a presidente, o Brasil tem uma situação externa favorável, com a projeção de US$ 40 bilhões de superávit na balança comercial feita pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, ante um déficit de US$ 4 bilhões em 2014.
Dilma considerou que outro ponto de melhora na economia foi a queda da inflação, mas relacionou a redução, bem como a alta no ano passado, ao preço da energia elétrica.
Pauta-bomba
Na entrevista, a presidente afirmou ainda que serão necessárias reformas profundas para o país, mas admitiu que para isso é preciso unidade. Ela criticou, por exemplo, as chamadas pautas-bomba votadas no Congresso, consideradas por ela como "disfunções" e citou, entre elas, o projeto de decreto legislativo (PDL) do deputado Esperidião Amin (PSD-SC) que altera a contabilização das dívidas dos Estados com a aplicação de juro simples em vez de juro composto. Segundo a Fazenda, a medida tem o potencial de gerar um rombo superior a R$ 300 bilhões aos cofres da União.
Dilma lembrou que no ano passado ao menos cinco grandes pautas-bomba com R$ 140 bilhões de perdas para o governo tramitaram no Congresso.
Reforma política
A presidente considerou também que é difícil supor que alguém reestruture a política no país sem uma reforma no setor. Dilma criticou o crescimento no número de partidos, o que torna difícil um acordo de governabilidade, e lembrou que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) conseguiu a maioria no parlamento com apenas três partidos e que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também necessitou de um grupo menor de legendas.
– No início do meu segundo mandato, nós temos 26 ou 27 partidos, com partidos que não têm representação congressual, e ainda o nível de unidade é diferenciado, com várias tendências de um único partido.
Dilma criticou novamente o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), responsável por aceitar o processo de impeachment que tramita contra ela. Para a presidente, Cunha é um dos grandes responsáveis pelas pautas-bomba e pela não votação de reformas necessárias no Congresso.
Para Dilma, o processo de impeachment marcará profundamente a história do presidencialismo no Brasil. Como fez na terça-feira, a presidente voltou a criticar Cunha e Temer na entrevista, sem citá-los nominalmente, classificando os políticos como chefe e vice-chefe do golpe, pois estariam agindo ocultamente.
*Estadão Conteúdo