Ao mesmo tempo em que inflamou a oposição e as ruas, a divulgação das escutas telefônicas com conversas da presidente Dilma e do ex-presidente Lula também endureceu o discurso do PT.
Enquanto críticos enxergam nas gravações um sinal de que a chefe da nação tentou obstruir a Justiça e proteger o aliado com foro privilegiado para escapar do juiz Sergio Moro, petistas estão convictos de que sua revelação é outra: o escancaramento de que as motivações do magistrado que analisa as investigações da Operação Lava-Jato são políticas.
Se as "arbitrariedades" da Justiça eram apontadas por líderes do partido desde a condução coercitiva do ex-presidente Lula, com a divulgação das escutas a sigla ganhou materialidade para reforçar o seu discurso. E a versão recebeu apoios insuspeitos, como o da revista britânica The Economist, para quem Moro "pode ter ido longe demais" no caso dos grampos.
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Em um vídeo divulgado no site do PT, o deputado federal Paulo Pimenta resume o sentimento interno:
– Moro não fez isso para ajudar na investigação, mas para instigar a violência nas ruas, para aumentar o clima de instabilidade porque, infelizmente, ele não está agindo como juiz, está agindo como militante político. A causa é atacar o PT, a Dilma, o Lula – critica.
Classificando como ilegais as escutas – gravadas depois de despacho para que fossem encerradas e divulgadas pela Polícia Federal com autorização de Moro no mesmo dia, antes mesmo de serem remetidas ao Supremo Tribunal Federal (STF), que teria a competência para analisar casos envolvendo a presidente da República –, os petistas veem na rápida divulgação a tentativa de influenciar o processo político.
– Lula não responde a um único processo formal. Querem montar um tribunal de exceção, típico de momentos fascistas. É um momento muito grave para o país, a crise política mais extensa que já vivenciamos, e a causa principal é a intransigência da oposição que não aceita o veredito das urnas – afirma o deputado federal Henrique Fontana, que também integra a comissão do impeachment na Câmara.
Em vez de recuarem diante do aumento do tensionamento político, a promessa é partir para o confronto ideológico.
– Está aumentando a raiva. O PT não se intimidou, nem vai se intimidar. Se pode dizer que a nomeação era para proteger o Lula, mas isso não é privilégio. Ele estava se protegendo de um "juizeco" que é capaz de fazer um negócio sem fundamento como esse – justifica um assessor de deputado federal petista, que tem pedido calma aos amigos "em pânico" que inundaram sua caixa postal no dia em que as gravações foram divulgadas.
Partidários alertam para risco de estado de exceção
Apesar do barulho das ruas, a avaliação é de que os manifestantes que se reuniram para protestar após a divulgação das escutas e da posse de Lula como chefe da Casa Civil (cuja validade está sendo questionada na Justiça) são os mesmos do dia 13. Enquanto os protestos forem restritos à "elite", partidários consideram a tensão administrável.
– A Lomba do Pinheiro começou a bater panela? Não começou – minimizam.
Para mobilizar a militância, o discurso é de que não está em risco apenas o mandato de Dilma na Presidência, mas a possibilidade de o país entrar em "estado de exceção". O alerta foi repetido em discursos na Esquina Democrática na quinta-feira, quando líderes de PT e PC do B, com apoio de entidades como CUT e CTB, participaram de ato.
– Deixou de ser um debate contra a corrupção e virou um debate político-ideológico. Essa divulgação dentro de um processo sério de investigação nunca iria acontecer. Está se construindo um clima de luta política, de ódio. Que se investigue tudo e todos, e não só o PT. O Eduardo Cunha continua lá e isso não parece problema – afirmou o presidente estadual do PT, Ary Vanazzi.