O cumprimento de um mandado de condução coercitiva contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na sexta-feira passada deu início a um debate entre juristas e especialistas quanto à aplicação do dispositivo legal. Nesta segunda-feira, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Marco Aurélio Mello, classificou o número de mandados de condução coercitiva como "violências praticadas". O ministro confirmou que a escolta policial forçada é legal, "mas deve ser precedida pela recusa do intimado em comparecer perante a autoridade que deve ouvi-lo".
– Precisamos sim consertar o Brasil, mas consertá-lo sem atropelos. Quando se cria o critério de plantão no afã de punir, de corrigir rumos, há um retrocesso – disse o ministro, alegando que nunca tinha se pronunciado sobre as conduções coercitivas por nunca ter sido questionado a respeito. – Pela primeira vez fui indagado a respeito e, evidentemente, tive que revelar qual a ordem jurídica. A atuação judicante (de quem exerce a função de juiz), da administração pública, é uma atuação vinculada ao direito positivo. E fora das balizas da Constituição Federal não há salvação. Sob a minha ótica (o número de mandados de condução coercitiva são) violências praticadas – concluiu o ministro.
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Ao comentar o assunto, na sexta-feira, o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Claudio Lamachia, disse não ser possível analisar o caso específico do ex-presidente sem conhecer todos os elementos da operação policial, mas afirmou que, em regra, a condução coercitiva é admitida apenas se houver a intimação prévia para comparecer e o cidadão se recusar a depor.
– Sem a negativa, a condução a força é desnecessária e ilegal.
Falsa controvérsia
Em nota, os procuradores da força-tarefa responsável pela Operação Lava-Jato classificaram o debate em torno do uso intensivo das conduções coercitivas como uma "falsa controvérsia". Os procuradores apontaram que o cumprimento dos demais mandados de condução coercitiva não provocou o mesmo "clamor".
Os procuradores alegaram que, no caso de Lula, a condução coercitiva foi necessária para garantir a segurança pública, das equipes de agentes e para a segurança do próprio ex-presidente. Além disso, os procuradores julgavam necessário ouvir os vários depoimentos ao mesmo tempo, para evitar "a coordenação de versões".
Além de Lula, mais dez pessoas foram alvos de mandados de condução coercitiva durante a 24ª fase da Lava-Jato, entre elas o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamoto. Os procuradores também citam as duas vezes em que Lula foi intimado a depor ao Ministério Público de São Paulo sobre supostos desvios ocorridos na Bancoop e não compareceu.
– Após ser intimado e ter tentado diversas medidas para protelar esse depoimento, incluindo um habeas corpus perante o TJSP (Tribunal de Justiça de São Paulo), o senhor Luiz Inácio Lula da Silva manifestou sua recusa em comparecer – afirmam os procuradores. – Assim, apesar de todo respeito que o senhor Luiz Inácio Lula da Silva merece, esse respeito é-lhe devido na exata medida do respeito que se deve a qualquer outro cidadão brasileiro, pois hoje não é ele titular de nenhuma prerrogativa que o torne imune a ser investigado na Operação Lava-Jato – dizem os procuradores, para quem a polêmica em torno da condução coercitiva de Lula "nada mais é que uma cortina de fumaça sobre os fatos investigados".
Os advogados do ex-presidente, Roberto Teixeira e Cristiano Zanin Martins, repudiaram as declarações dos procuradores alegando que, anteriormente, Lula prestou três depoimentos, dois à Polícia Federal e um ao Ministério Público Federal (MPF). Para os advogados, a condução coercitiva é "uma medida que cerceia a liberdade de ir e vir".