Conforme o levantamento do Diário Gaúcho, desde o dia 3 de janeiro, quando o jovem Leonardo Pereira dos Santos, o Leo Samuka, 18 anos, foi executado com pelo menos dez tiros na Vila Jardim, pelo menos 27 pessoas foram assassinadas no confronto entre facções criminosos que começou na Zona Leste de Porto Alegre mas já fez vítimas em pelo menos seis bairros da Capital. Destas vítimas, pelo menos 10, ou 37%, não tinham qualquer relação com a criminalidade.
Muito mais do que a crueldade dos números, para a operadora de caixa, Denise Borba Rodrigues, 36 anos, a noite da última terça ficará marcada para sempre na memória. Com a imagem do pai, o servente de obras Norberto Rodrigues, sentado à margem da calçada estreita na casa da tia dela. No começo da noite de terça, ela nem parou para conversar com ele. Deu "oi" e seguiu seu caminho para casa.
Em pouco tempo, ouviu, e tratou de se proteger dos tiros que ficaram marcados também na porta da sua casa, no Beco dos Coqueiros, Vila Cruzeiro, no Bairro Santa Tereza. Foram mais de 50 disparos a esmo na rua.
– Não consigo acreditar que isso aconteceu. Não dá para entender como o lugar em que fomos criados virou um campo de guerra e o meu pai foi levado desse jeito – lamenta a filha.
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Norberto morava naquele ponto da Vila Cruzeiro há 38 anos. Criou ali os sete filhos e já tinha três netos. Segundo a polícia, a vila é o reduto da quadrilha conhecida como V7. O servente de obras nunca teve qualquer relação com isso
– O que vemos nesse confronto são alguns crimes sem um alvo específico. A intenção, muitas vezes, é marcar presença dentro do que acreditam ser o território contrário. E aí disparam a esmo – diz o delegado Rodrigo Pohlmann, que responde pela 6ª DHPP.
Sai a BM, entram os bandidos
A suspeita da polícia é de que o ataque de terça à noite, repetido com novos tiros no mesmo local no final da tarde de quarta, tenham sido cometidos por criminosos ligados à facção dos Bala na Cara como retaliação pelo crime com as mesmas características, que vitimou um pintor e um comerciante – igualmente sem relações com os criminosos em guerra –, no Bairro Bom Jesus na noite de sábado.
Os V7 são os principais suspeitos por terem coordenado aquele ataque. O que intriga o comando da Brigada Militar foi a estratégia dos criminosos. A Vila Cruzeiro e o Bairro Bom Jesus estavam sob patrulhamento o dia inteiro na terça. Pois a suspeita é de que o bando aproveitou-se de duas "brechas" nessas ações para sair do Bom Jesus e entrar na Cruzeiro.
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– Esse carro já estava rondando do lado de fora da vila. Parece que só estavam esperando a Brigada sair para entrarem – conta um morador do Beco Coqueiros.
O major Sérgio Rocha, que responde pelo comando do 1º BPM, admite a possibilidade de que os criminosos tenham monitorado a frequência de rádio da Brigada Militar.
– Infelizmente a nossa frequência é analógica e pode ser captada. A mudança para digital exigiria um investimento – explica.
Hoje, rádios-comunicadores HT podem ser comprados por apenas R$ 30. Com o equipamento, os criminosos só têm o trabalho de copiar a frequência usada pelo policiamento e assim antecipar os seus passos.
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