Para quem passa em frente ao prédio de 13 andares do Instituto de Previdência do Estado (IPE), na Avenida Borges de Medeiros, na Capital, os danos deixados pelo temporal do final de janeiro saltam aos olhos. Cento e um retângulos, nos quais antes havia vidros, estão cobertos por pedaços de madeira. Mas quem tem acesso às repartições enxerga muito mais - algo que o temporal apenas agravou: a falta de manutenção dos prédios públicos.
Não existe levantamento do governo estadual sobre edificações mal conservadas ou das que foram afetados pelos ventos de 119 km/h que abalaram a Capital há mais de três semanas. ZH percorreu quatro sedes que oferecem atendimento à população e verificou que parte deles ainda está com serviços afetados.
- Sempre tive receio de andar aqui (no prédio do Instituto de Previdência do Estado - IPE). Agora, é de dar medo - afirma Roberto Max Liebstein, vice-presidente do Sindicato dos Servidores do IPE (Sindipe).
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Em quatro pontos do prédio, em três andares diferentes, a estrutura metálica que sustenta as janelas (chamada de longarina) se descolou da parede, abrindo uma fenda por onde é possível enxergar o andar inferior. Há goteiras em todos os setores, fiação exposta e montes de entulhos pelos corredores. Dos oito elevadores (todos com mais de 40 anos), apenas dois estavam em operação no início da semana no prédio onde também funciona a Defensoria Pública.
Atendimento ao público apenas no primeiro andar
Setores do IPE apresentam goteiras, infiltrações e fiação exposta (Foto: Diego Vara)
O risco de circular pelo prédio é admitido pela direção do IPE. Tanto que, um dia após a reabertura para atendimento, há uma semana, o acesso do segundo ao 13º andar foi restrito apenas a servidores. Para atender à demanda do IPE e da Defensoria Pública, uma estrutura foi montada no subsolo e no térreo. Apenas em casos de extrema necessidade, é permitido subir.
- Não dá mais para as pessoas ficarem andando aqui. Chegamos em um limite - afirma o diretor administrativo-financeiro do IPE, Eduardo Dias Lopes.
O contrato emergencial, estimado em mais de R$ 1 milhão, para recuperação da cobertura, recolocação dos vidros e impermeabilização de setores, está em elaboração e não existe previsão de início das obras. A reforma da fachada e a compra de novos elevadores, orçados em mais de R$ 14 milhões, não têm expectativa de sair do papel, pois é necessário que o governo libere recursos. Segundo o IPE, apenas dois elevadores devem ser substituídos este ano.
A falta de plano de prevenção e proteção contra incêndio (PPCI) no instituto é investigada pelo Ministério Público Estadual. O prazo para cumprir exigências dos Bombeiros vence no final do mês, mas o IPE negocia prorrogação devido aos estragos do temporal.
Detran usa contêiner abafado e mal iluminado
Engenheiros detectaram temperatura acima de 37ºC em sala de provas do Detran (Foto: Diego Vara)
Um contêiner que era para ser provisório - mas já é utilizado há dois anos e meio - abriga a sala de provas teóricas e a junta médica do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) na Capital. O temporal danificou a estrutura elétrica e levou ao cancelamento de exames.
Antes do vendaval, uma avaliação de engenheiros contratados pelo Sindicato dos Servidores do Detran (Sindet) havia detectado temperatura acima de 37ºC na sala onde são aplicadas as provas, além de iluminação precária.
- O lugar, onde passam mais de 400 pessoas por dia, é uma gambiarra permanente - avalia o presidente do Sindet, Maximilian da Rocha Gomes.
O órgão admite que há problemas com os condicionadores de ar, mas que novos equipamentos foram comprados e que uma sobrecarga da rede elétrica está sendo resolvida.
A previsão é de que a aplicação das provas seja transferida para o Centro Administrativo Fernando Ferrari (Caff) no segundo semestre deste ano.
Interdição em parte do Centro Administrativo
Parte do espaço da Secretaria de Educação está bloqueada (Foto: Diego Vara)
O Caff está encardido por fora e jorra água dos condicionadores de ar. Alvo de fiscalização do Ministério Público Estadual (MP), com situação agravada após a queda de um elevador no final do ano passado, a Secretaria da Modernização Administrativa e dos Recursos Humanos (Smarh), responsável pelo complexo, garante que a manutenção do prédio está em dia:
- Tivemos problema com elevadores quando estávamos trocando de empresa de manutenção. Todos os serviços estão funcionando - afirma o secretário-adjunto em exercício João Portella.
Segundo ele, os danos causados pelo temporal, como quebra de 280 telhas e alagamento em um anexo do prédio, não tem relação com falta de cuidados. O espaço que permanece interditado é a central de matrículas da Secretaria de Educação. O atendimento é feito no auditório do complexo. Portella garante que o prédio tem plano contra incêndio, mas que faltam alguns equipamentos exigidos pela nova legislação, que estão sendo providenciados.
Delegacias também sofrem com falta de estrutura
Problemas como goteiras e cupim se acumulam na 16ª DP da Capital (Foto: Diego Vara)
A 16ª Delegacia de Polícia da Capital, localizada em um dos bairros mais violentos, a Restinga, é o retrato da falta de manutenção dos postos policiais. Não há uma porta sequer que não esteja tomada por cupins, inclusive a sala do delegado. Há um único banco em L para abrigar vítimas e autores de crimes. Das quatro impressoras, apenas uma funciona. Uma das cortinas é feita de saco de lixo. Das duas celas, uma é usada como depósito. Há ainda goteiras, infiltrações e desníveis no piso.
- Se eu mesmo não chamasse um chaveiro, a delegacia sequer poderia ser trancada - afirma o inspetor Alexandre Correia da Silva. - Não basta estarmos com metade do efetivo, não existe estrutura para trabalharmos.
Segundo avaliação dos sindicatos ligados aos policiais civis, 50% das delegacias necessitam de reformas urgentes.
- O prédio do Denarc (Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico) está caindo. Tem delegacia de homicídios onde o cartório funciona dentro do banheiro. Outra DP funciona em uma parada de ônibus. Está vergonhoso - reclama o presidente do Ugeirm-Sindicato, Isaac Ortiz.
A assessoria da Polícia Civil não se manifestou sobre o assunto.
CONTRAPONTO
O QUE DIZ A SECRETARIA ESTADUAL DA FAZENDA
"É de conhecimento público que o Estado atravessa uma situação de extrema dificuldade em suas finanças (...) o que se reflete na nossa já reduzida capacidade de investimento. Cada secretaria recebe cota orçamentária a cada mês e cabe a cada uma delas definir suas prioridades específicas".