O capítulo final de uma história que atingiu a Polícia Civil em cheio em 2000, quando surgiu a suspeita de que policiais de delegacias de Porto Alegre recebiam propina do jogo do bicho, teve desfecho nesta semana.
Na última quarta-feira, a Vara de Execuções Criminais (VEC) da Capital emitiu decisão reconhecendo a prescrição do caso. Com isso, os policiais condenados não terão de cumprir a pena que foi aplicada em 2006.
O caso tramitou durante 16 anos: os 14 agentes investigados à época foram denunciados pelo Ministério Público em 2001, sendo que 12 foram condenados a pena de quatro anos e seis meses, um foi absolvido, e outro morreu antes do julgamento. Dos condenados, dois morreram.
Com o fim dos recursos, a Justiça estava dando andamento à execução das sentenças. Sete pessoas tiveram mandados de prisão expedidos pela Vara de Execuções Criminais (VEC) nos últimos dias, e seis já haviam sido presos pela Corregedoria-geral da Polícia Civil (Cogepol). Com a prescrição reconhecida na quarta-feira, a Justiça determinou a soltura de todos.
Quando as prisões começaram a ocorrer, a defesa de quatro dos 10 que tinham pena a cumprir fez um requerimento à VEC solicitando que fosse examinada a ocorrência de prescrição. Conforme o advogado Michel Moraes, com base na súmula 497 do Supremo Tribuna Federal (STF), houve prescrição em 2014.
Ao analisar o recurso de Moraes, o juiz Paulo Augusto de Oliveira Irion, da VEC, constatou que, realmente, o direito do Estado de executar as penas, ou seja, de prender os condenados, prescreveu em novembro de 2014. Nos últimos 15 dias, a Cogepol havia prendido cinco policiais aposentados e um ex-policial (o servidor foi demitido da corporação). Um servidor aposentado que não fora encontrado no endereço residencial estava sendo procurado.
Três agentes – dois que ainda trabalham na polícia e outro aposentado –, ainda não tinham contra si mandado de prisão. Foi o advogado deles que ingressou com pedido de análise de prescrição.
Entenda o caso
O caso que está tendo desfecho agora surgiu a partir de uma operação em uma banca do jogo do bicho, em 2000. Em apontamentos apreendidos no local constavam nomes dos policiais, os telefones deles, as delegacias em que trabalhavam e valores que indicariam o quanto de propina era pago a cada um.
Um ano depois, em 2001, o MP denunciou 14 policiais, um bicheiro e sua mulher, além de um filho do bicheiro. O contraventor, que era acusado de corrupção ativa, foi absolvido depois de recorrer. Sua mulher e o filho tiveram a punibilidade extinta pela prescrição.
Conforme o corregedor da Polícia Civil, delegado Andrei Vivan, ainda hoje surgem denúncias pontuais do suposto envolvimento de policiais com o jogo do bicho:
– Mas nada parecido com o esquema organizado que foi descoberto naquele episódio.
Apesar da contundência do caso, os processos administrativos feitos pela corporação e que poderiam culminar na demissão dos policiais investigados foram todos arquivados pelo Conselho Superior de Polícia. O único do grupo que foi demitido por iniciativa da polícia foi expulso por outra suspeita, e não pela relação com o jogo do bicho.
Quando foram condenados em 2006, a Justiça determinou a perda do cargo dos policiais, mas a decisão foi revertida pelo Tribunal de Justiça (TJ). O grupo teve sentença de 1º grau confirmada pelo TJ em 2009, justamente o ano em que o STF mudou o entendimento sobre réus serem presos depois da decisão do 2º grau.
Desde então, podiam recorrer em liberdade aos tribunais superiores. No último dia 17, o STF voltou atrás, admitindo que ocorra prisão enquanto há recurso em Brasília.
Com a prescrição em relação aos policiais condenados por receber propina do jogo do bicho, fica encerrado um dos casos emblemáticos do governo Olívio Dutra (PT) no combate à corrupção policial.